segunda-feira, 22 de abril de 2024

Ventos de Primavera

Tem soprado um vento de primavera para este lado da Baía. Mesmo que tímido, tem entrado e bagunçado de forma avassaladora essa temporada, tem sido tempo de uma ansiedade benigna, de ver diante dos meus olhos desconfiados as coisas entrando onde realmente deveriam estar. 

Tenho muitos medos e muitos deles não são tão justificáveis, confesso. Pode até parecer um pouco estranho, mas tenho um medo profundo da BR à noite. Depois das 22hrs, olhar para aquele mar e só ver refletido a lua em suas pequeninas ondas me dá medo. Sentir a cada passada de carreta, tão perto, uma sensação de pequeneza profunda, de uma insignificância retumbante diante daquela estrada que tem vida, é desesperador. O mais curioso é que ao mesmo tempo o impulso que vem diante de meu coração é de seguir cada vez mais rápido, de pedalar cada vez mais forte, pois estou vivo. Vivo diante daquelas carretas tão grandes, vivo em cima de toda aquela rodovia que grita e aterroriza, pedalando por cima das humilhações, das cátedras, da depressão, das velhas formas de vida. Mesmo em meio ao terror a bicicleta gira e o tesão toma conta, tenho uma queda pelo susto, um pacto com o terror da BR-101.  

Esse mês senti o vento da primavera soprar para esse lado da Baía de Guanabara, confesso que enquanto pedalava olhando o mar e a lua em meio a escuridão completa da BR, chorei. Um choro de primavera, um choro de mudança, um choro com gosto de vida. 

São Gonçalo, 2024