quinta-feira, 2 de maio de 2024

As Borboletas

 Dizem que as borboletas são sinais de mudança e de todas as crendices populares é uma das que mais gosto. Pois as borboletas são graciosas, alegres: verdadeiras alegorias de como a vida é curta e que todo dia é dia de viver. 

Tem sido um tempo de borboletas, mesmo sem eu ter visto alguma e confesso uma das coisas que descobri recentemente, é que tenho medo de borboletas. São tantas lutas travadas (e vencidas?) que acaba sendo difícil comemorar, difícil saber a hora que podemos respirar fundo e somente olhar o horizonte de forma calma e pausada, sem desespero ou receio. De peito aberto ao vento, esperando a vida acontecer. 

Viver deste lado da cerca é lutar a todo momento e o que podemos fazer em meio às tormentas que mudam tudo de lugar, é entender sempre em qual lado estão as borboletas e não ter medo de voar em meio a elas. Abrir o peito para o novo, com paixão e tesão pelo frescor da alvorada. 

São Gonçalo, 2024 


Um Dia Normal

 O sabor de ter um dia normal é como se deleitar em uma sintonia tão robusta de paz, de adentrar um ritmo tão leve que evoca os sentimentos mais ínfimos e pequenos. Aquele momento em que podemos fechar os olhos e bocejar bem fundo, sem medo do julgamento, sem qualquer peso. 

Tem dias que o complicado nos atormenta tanto, que o simples parece o que temos mais de precioso. Queria escrever hoje sobre um dia normal, um dia bom, daqueles que a gente lembra no calendário e que não aconteceu absolutamente nada grandioso ou planejado, que o que aconteceu foi simplesmente a vida caminhando em um caminho bem conhecido e até de certo modo clichê, mas que de fato foi um dia de olhar para dentro e poder respirar o mais profundamente possível e dizer:

 “Hoje não fui a história triste de sempre”. 

São Gonçalo, 2024




segunda-feira, 22 de abril de 2024

Ventos de Primavera

Tem soprado um vento de primavera para este lado da Baía. Mesmo que tímido, tem entrado e bagunçado de forma avassaladora essa temporada, tem sido tempo de uma ansiedade benigna, de ver diante dos meus olhos desconfiados as coisas entrando onde realmente deveriam estar. 

Tenho muitos medos e muitos deles não são tão justificáveis, confesso. Pode até parecer um pouco estranho, mas tenho um medo profundo da BR à noite. Depois das 22hrs, olhar para aquele mar e só ver refletido a lua em suas pequeninas ondas me dá medo. Sentir a cada passada de carreta, tão perto, uma sensação de pequeneza profunda, de uma insignificância retumbante diante daquela estrada que tem vida, é desesperador. O mais curioso é que ao mesmo tempo o impulso que vem diante de meu coração é de seguir cada vez mais rápido, de pedalar cada vez mais forte, pois estou vivo. Vivo diante daquelas carretas tão grandes, vivo em cima de toda aquela rodovia que grita e aterroriza, pedalando por cima das humilhações, das cátedras, da depressão, das velhas formas de vida. Mesmo em meio ao terror a bicicleta gira e o tesão toma conta, tenho uma queda pelo susto, um pacto com o terror da BR-101.  

Esse mês senti o vento da primavera soprar para esse lado da Baía de Guanabara, confesso que enquanto pedalava olhando o mar e a lua em meio a escuridão completa da BR, chorei. Um choro de primavera, um choro de mudança, um choro com gosto de vida. 

São Gonçalo, 2024 


quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

A Lógica das Marés

Definitivamente não sei escrever. Porém pensei aqui comigo, que falar sobre os meus sombrios sonhos desta quinta-feira não deve ser mais difícil do que entender esse vai e vem das marés da Baía de Guanabara. Ontem elas estavam tão altas pela manhã que por um momento pensei que fossem invadir a rua. Porém hoje estavam tão baixas que um cheiro de morte entrou forte em meus pulmões, me fazendo sentir uma vontade muito profunda e genuína de vomitar. 

Eu costumo sonhar com a Baía de Guanabara, essa semana mesmo sonhei que estava navegando no meu caíco para a ilha de Jurubaiba. Eu e o mar, o sol e a maré. Nunca fui difícil de agradar, meu éden é um dia de sol e sombra fresca embaixo de uma árvore na Praia da Luz, eu poderia passar a vida toda naquele sonho. Infelizmente uma voz lá do fundo me acordou e logo senti amargamente aquele cheiro de morte que estava por todo lugar, não saiu do quarto por nenhum segundo naquele dia. 

Tenho sonhos sombrios sobre mangues. Sobre mangues de lama espessa, aqueles que conseguem engolir histórias, que conseguem limpar até a mais poluída água que passa por ali. 

Hoje é quinta-feira. Tive um sonho desses. Sonhei que estava andando na Ary Parreiras e de repente todo aquele valão fedorento virava um mangue e me engolia, tentei lutar, mas de que adianta? A maré estava mais forte. A maré sempre é mais forte e aquele cheiro de morte estava por todo lado. 

Eu gostaria de entender a lógica das marés, não sei porque precisam ser tão fortes em dias tão normais, não entendo porque precisam ser tão devastadores naqueles dias mais sombrios. Na baixa e na alta, nunca vai embora, está sempre na espreita pronto para engolir braços, pernas e histórias. 

São Gonçalo, 2024



sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Sobre uma Criminosa

 Nem sempre é possível escrever uma crônica suave, pois nem sempre a vida é uma música do Frank Sinatra. Mas hoje olhei disfarçado para aquele furacão e só o que consegui sentir foi um friozinho profundo na espinha. Era como se eu pudesse escutar ao fundo “I’ve got a crush on you” tocando enquanto eu a admirava com aquele belo vestido preto. Os últimos tempos não têm sido fáceis, mas às vezes me pego um pouco distraído e quando percebo já estou com a cabeça distante, lá naqueles dias. Não sei o que acontece, é só um impulso que acomete minhas entranhas e me faz pensar coisas, imaginar coisas, lembrar de coisas. Sério, acho um absurdo uma pessoa ser tão bonita assim, de verdade, deveria ser crime. (Um em que eu definitivamente teria que ser o juiz, júri e executor).

Tem dias que eu queria conseguir dizer as coisas de forma mais clara, tem dias que meu maior sonho era ser um homem que não escreve uma crônica sobre a profunda complexidade de estar querendo muito beijar a boca de uma alguém específica. 

A perversão é condenada socialmente, a idealização ainda mais, e não tenho mais saída. Só nos resta o bom e velho cotidiano dramático. 

- São Gonçalo, 2023

sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Sou de São Gonçalo

 Sou de São Gonçalo. Cresci andando descalço pela feira de Neves, jogando bola nas ruas de meio-fio alto do Boa Vista, me perdendo no caos de Alcântara e naquelas espaçadas quadras do Jardim Catarina. É uma loucura, aquelas ruas parecem realmente todas iguais e as calçadas, tão esburacadas, parecem mais autênticas. 


Sou de São Gonçalo. Sempre gostei da Praça da Trindade, pois até The Smiths tocava. Lá tinha rap, samba, funk, pagode e até gospel. A Lapa era em São Gonçalo, lá na Parada 40. Maldito Capitão Linguiça, acabou com aquele lugar. É incrível porque qualquer buraco depois de 0h em São Gonçalo vira point. O povo daqui sabe curtir. 


Sou de São Gonçalo. Teve até uma vez que peguei um ônibus que dizia para calar a boca e que me levou pra Maricá. Isso só não é mais peculiar, do que pensar, que em São Gonçalo também tem mar. Apesar dos apesares, a Praia das Pedrinhas está lá de pé, e é tão bonita que não merecia ter em suas pedras tanto esgoto. O que podemos dizer também da Praia da Luz, da Serra das Palmeiras, do vulcão? Aos meus olhos não existe lugar mais bonito, mas hoje em dia são quase como lenda urbana. O velho Estado é tão sádico, conseguiram criminalizar até mesmo a natureza, pois a pobreza já se tinha feito há tempos aqui. 


Sou de São Gonçalo. Sou marginal e não sou herói, sou como qualquer pessoa normal tentando sobreviver, viver em São Gonçalo é ser marginal. Não estamos à margem da Baía de Guanabara (mesmo que geograficamente estejamos), estamos à margem da urbanidade, do desenvolvimento, da dignidade. 


Sou de São Gonçalo. A violência é tônica diária, pois todo dia esse chão é encharcado de sangue. O barulho das balas assombram, tiram o sono, mas quando o sol ainda nem levantou, todos os dias, o terminal de Niterói já está lotado. Esse povo tão massacrado não se entrega. Quanto mais caveirão, mais luta. A raiva só tem aumentado, a rebelião é questão de tempo. 


Sou de São Gonçalo. Meu maior sonho não é ter um apartamento na Lopes Trovão, Icaraí fede. Meu sonho é viver em uma São Gonçalo diferente, sem mortes, sem favelas, sem pobreza, sem aqueles velhos buracos da Manoel Duarte. 


São Gonçalo, 2023


domingo, 17 de setembro de 2023

''Superman Entre a Foice e o Martelo'': A Propaganda Anti-Comunista Mais Burra da História

 Na época em que a péssima Panini Comics re-imprimiu ‘’Superman: Entre a Foice e o Martelo’’, sai correndo para arrumar uma edição para mim. A fama que a precede já existia e me causava certo sentimento dúbio: ao mesmo tempo que pensava sobre como ver um dos principais símbolos da cultura estadunidense com o símbolo máximo do proletariado internacional no peito era algo realmente peculiar, o medo da história se tratar basicamente de propaganda anti-comunista não me deixava ter grandes expectativas para essa que é uma das graphic novels mais polêmicas já criadas. 

Não tem como avaliar esta HQ sem falar sobre símbolos e o Superman representa basicamente deus, os ideais burgueses e protestantes de ver a vida e o mundo. Um mundo que poderia ser salvo sempre por uma única pessoa, dotada de um talento ou habilidades especiais, que é benevolente e é capaz de levar ‘’justiça’’ a sociedade como um todo. Pode parecer distante para quem não aprofunda o olhar, mas esse personagem tem como único objetivo de fato se portar como um messias que anda entre os mortais, que não revela sua identidade e ‘’ganha a vida’’ como qualquer outra pessoa, mas que ao fim do dia se revela o salvador, o escolhido, por ser mais puro e trabalhador. O Superman tem sobre sua imagem a própria representação da justiça burguesa encarnada. Não existem pobres, nem ricos para o Superman, pois o que vale é a lei e a justiça!


 

Bom, é notório que todos os teóricos liberais bebem de uma visão basicamente idealista do mundo, não enxergam a luta de classes como o verdadeiro motor da História e sendo assim, sempre estarão fadados ao fracasso ao analisarem a sociedade em que vivemos. O Superman sobre esse ponto de vista é uma mentira não simplesmente por voar ou ser super forte, mas sim por representar um jeito de ver a vida e o mundo idealista e que não se sustenta na realidade, pois de fato o que mudança as coisas de modo mais profundo é a luta de classes e em última instância, a Revolução. 

De todo modo, voltando a HQ, o que vemos em ‘’Superman: Entre a Foice e o Martelo’’ é completamente diferente deste Superman, Mark Millar fez um exercício interessante ao imaginar como seria se o Superman tivesse caído na URSS ao invés dos EUA e o que isso acarretaria. É interessante pensar que essa HQ foi escrita justamente em um momento que existia no mundo, alimentado pelo imperialismo ianque e pelo fim ‘’oficial’’ da URSS uma ideia de ‘’fim da história'’, um discurso que dizia que agora não existiriam mais revoluções proletárias, que daquele momento em diante as lutas seriam somente no campo burocrático das instituições burguesas. Esse momento possibilitou um certo afrouxamento muito momentâneo da propaganda anti-comunista, e foi na esteira disso, que Mark Milar constrói um Superman que não era um super-herói, mas sim um grande chefe comunista. 

É uma loucura pensar como as coisas são colocadas de formas muito sutis dentro da trama, que apresenta o Superman em suas atribuições políticas e militares, acaba muitas vezes se esquecendo até mesmo dos poderes do mesmo. É incrível como o camarada Stálin é representado na história como ele de fato era, como um personagem extremamente importante na História e como um grande dirigente comunista que foi. As obras estadunidenses costumam o retratar uma imagem mentirosa como um crápula, psicopata ou de forma deturpada, mas nessa história ele é muito bem representado.

A trama é muito completa, pois consegue fazer links históricos e estabelece diálogos e debates muito importantes sobre a questão do imperialismo, fazendo metáforas e referências se utilizando de personagens do próprio universo DC que ali estavam sendo representados de outra maneira, de modo muito sério e real, servindo de pano de fundo para os questionamentos que acabavam sendo levantados.

Por tudo isso, a história consegue prender o leitor de uma maneira absolutamente empolgante e os plots que são trazidos em muitos momentos são muito surpreendentes. É muito interessante pensar que o desenvolvimento do Superman dentro da história, que caminha no sentido de seu avanço enquanto verdadeiro quadro do partido bolchevique, sua politização crescente conforme a história caminha é genial, principalmente pois Millar faz um exercício de imaginação (e constrói uma metáfora) sobre como seria a URSS se houvesse um quadro a altura do grande Stalin para continuar com a revolução de forma correta. É essa transformação do ícone que é o grande acerto desta HQ, a ideia de que a sociedade não precisa de super-homens, mas sim de pessoas dispostas e capazes de guiá-la para o caminho correto.

É claro que há elementos que podemos identificar como uma tentativa de criticar a luta revolucionária e a própria URSS, mas são colocadas de forma tão rápida e sutil que o impacto positivo se sobrepõe. Talvez (provavelmente) essa HQ foi o maior caso de erro em uma propaganda anticomunista em todos os tempos, erraram completamente a mão e é exatamente por isso que ela é fabulosa. 

*a animação não tem nada a ver com a HQ


domingo, 10 de setembro de 2023

Sandman e o Mundo Real do Sonhar

 Lembro como se fosse hoje o dia em que vi pela primeira vez uma edição de Sandman, foi no dia em que iniciei minha jornada no mundo das HQs. Tinha uma capa com um pássaro marron em um fundo escuro, me chamou a curiosidade e quando li o enunciado pensei ‘’isso é realmente algo que eu leria’’. É claro que os R$200 reais do preço de capa e as outras 4 edições eram uma barreira intransponível naquela época. Esse mês fazem 10 anos desse dia e desde aquela época foi sempre um verdadeiro objetivo conseguir ler essa obra transcendental, que só pela mítica já me atraiu, mesmo nunca tendo nem lido nada na minha vida aquela altura de meus 13 anos. Essa introdução pode ser que entregue um pouco, mas a minha reação ao anúncio do relançamento de Sandman pela Panini em um formato trimestral a um preço acessível, em razão do aniversário de 30 anos da saga, foi simplesmente indescritível. 

É sempre bom ressaltar que a fama da obra prima de Neil Gaiman, lançada entre 1989 e 1996, às vezes pode provocar nas pessoas antes de lerem um sentimento de que há na trama grandes reviravoltas ou uma história absolutamente mirabolante, porém não, Sandman não é sobre isso. A história de Sandman é definitivamente um pano de fundo para todas as metáforas presentes na história, para as reflexões profundas que estão inseridas em seus quadros, para diálogos simples que se integram e constroem todo um ideário, uma constelação do que é o Sonhar e Sandman. 

Os capítulos apesar de construírem passo a passo a mitologia e o desenvolvimento da jornada de Morpheus, possuem vida própria e buscam sempre ter um início, meio e fim próprios, sendo vários destes muito destacados, como temos ‘’Um Jogo de Você’’, ‘’Estação das Brumas’’, ‘’Entes Queridos’’ e tantos outros são parábolas maravilhosas de nossos sonhos mais íntimos, de como queríamos que a vida fosse diferente ou como as pessoas lutam para materializar seus sonhos no mundo real, mesmo que muitas vezes não sendo possível transformar em real de forma cabal. Nos provoca a refletir sobre nossa relação com as pessoas próximas a nós e também a nós mesmos, a pensar em como estamos vivendo e se mesmo estamos vivendo. O mais incrível é como Gaiman consegue transformar aspectos absolutamente míticos ou fantasiosos como fadas, deuses e até mesmo a personificação da morte em elementos muito palpáveis de nosso cotidiano. 



Os personagens que são apresentados ao longo da saga são absolutamente bem trabalhados e possuem características, histórias, contextos e profundidades muito bem desenvolvidas. É claro que Morpheus é o grande protagonista e todas essas dinâmicas e reflexões são de certa forma ligadas a ele (por motivo bem óbvio, ele é literalmente o sonho, a encarnação de todos os nossos anseios e desejos e também o elemento central da construção de Sandman), porém diversos personagens se estabelecem de forma tão preponderante, que "roubam a cena". Morte por exemplo: irmã do Sonho, a que deveria ser a executora, rodeada de amargura e dor, é quem em diversos momentos representa o renascimento, a vontade de continuar a luta e a encorajar seu irmão a não ser tão derrotista. É quem exala vida, mesmo sendo a fim. Morte é apresentada como a ponte entre a vida e os sonhos, a chama que mantém acesa a vida mesmo sendo sua nêmesis. Os demais personagens derivam todos de metáforas, possuem visão e características muito próprias das mitologias que representam. Como Delírio, que representa um olhar de criança do mundo e que em muitos momentos é uma das personagens mais lúcidas de toda a história, ou como Lúcifer, o estrela da manhã que se cansou das velhas tradições e do seu velho mundo e decidiu deixá-lo para trás, começar uma nova vida em um novo mundo, além de tantos outros personagens que buscavam de alguma forma encontrar sua felicidade em seus sonhos e batalhavam contra a realidade para alcançar. 

Não pretendo aqui entrar em capítulo por capítulo, mas a forma como é construída a história nos conduz a entender Sandman como uma saga de atos distintos, que provoca o leitor a realmente ver do ponto de vista do sonhar o dia a dia de nossas vidas, para entendermos o quanto nossos sonhos são ligados com a capacidade de imaginarmos um mundo melhor, diferente, um mundo onde podemos vivermos sem todos esses pesos desta sociedade doente que vivemos. Em Sandman está presente os motivos do quanto é difícil sonhar, do quanto é difícil enfrentar essa sociedade sem perdermos os nossos sonhos. 




A arte incrível também precisa ser ressaltada, combina exatamente com tudo que Gaiman busca passar em sua obra, essa irreverência e magnificência do sonhar e dos perpétuos. Sandman é fabuloso, magnífico, uma reflexão profunda sobre nossos sonhos e a vida real. 



domingo, 16 de julho de 2023

Deus me Livre não Ser do Brasil

 Me perdoe Lima Barreto, pois tenho meus momentos de ufanismo. Tem dias que embalo-me pelos sorrisos no ritmo do samba e da luta, quando percebo, já estou sentindo uma satisfação genuína de pertencer ao povo brasileiro. Eu nasci no Rio de Janeiro e nunca fui ao Cristo Redentor, nunca vi de perto os lençóis maranhenses ou naveguei pelo Pantanal Matogrossense. A Amazônia é distante, assim como os Pampas e mesmo São Paulo, parece longe demais. Não conheço o meu país, somente o nosso povo, pois o Brasil do tupi, o vermelho como brasa, é comum a todos nós. 

É uma loucura tão grande pensar na extensão absurda que se estende o nosso país, um verdadeiro mundo de variedades, culturas, histórias, que se encontram em algo comum: a luta.  Apesar das falácias e mentiras repetidas tantas vezes, aqui nessa terra de norte a sul, se resiste desde de tempos que lá se vão. Desde as primeiras lutas de resistência indígena contra a invasão portuguesa, até às incontáveis revoltas camponesas durante a história desse país e as lutas contra a ditadura militar e esse velho Estado que tanto insiste em tentar nos massacrar.

Eles nunca irão conseguir. O nosso povo nunca vai desistir da luta. 

Olhei em volta, em um dia tão trabalhoso quanto hoje, acabei me embalando pelos sorrisos, me contagiei pelas histórias, pela voracidade, pela luta de pessoas que nunca abaixam a cabeça e desculpe-me Lima, pensei: "Deus me livre não ser do Brasil". 

Rio de Janeiro, 2023



segunda-feira, 10 de julho de 2023

Sobre o ''Junho Febril'' de Igor Mendes

 A literatura é muito mais sobre pessoas do que frases bonitas e estrofes gramaticalmente perfeitas. O mais magnífico em autores como Graciliano e Lima Barreto, é o jeito ímpar de retratar o nosso povo, nas mais diferentes formas que esses se apresentam. Como os cariocas do início do século XX, presentes na escrita marginal de Lima Barreto ou as mulheres e homens do campo de Graciliano, retratados em São Bernardo. Eles os retratavam tão bem, que ler um desses livros é como se teletransportar para outro tempo, para outros lugares. Entendendo as origens dos personagens, suas angústias, ambições e lamúrias, suas lutas e revoltas, podemos até nos sentir amigos, irmãos ou eles próprios. 



É exatamente essa a sensação que ‘’Junho Febril’’, de Igor Mendes, nos proporciona a cada página. 

Podemos dizer que os três personagens principais são como espectros de toda a revolta contida na juventude de nosso tempo, são representações fiéis de uma geração que não aceita mais ver os seus chicoteados, que foram e estão sendo ainda hoje, conduzidos a uma decisão que só leva a dois caminhos: o da luta ou da negação completa da realidade concreta. Nesse contexto, as grandes jornadas de junho de 2013 (que se estenderam até 2014) foram o momento de quebra de paradigma, do fim das ilusões e podemos sentir isso claramente lendo o livro. Tanto Navalha, quanto Flávia e Apê em suas infinitas diferenças, foram empurrados para aquele grito uníssono de um povo em completa rebelião contra seus senhores.

Chama atenção como o livro consegue desenvolver tão profundamente os seus personagens. A escrita na primeira pessoa cumpre o papel de nos colocar no chão das tramas, para sentirmos as dores, prazeres, dissabores e até mesmo raiva e reprovação sobre as atitudes dos personagens. A todo momento as dúvidas e inseguranças dos personagens são expostas durante a trama, que vai caminhando exatamente por entre tais elementos. É uma dinâmica absolutamente gostosa de ler e perceber.

Falar sobre os três protagonistas nessa resenha é quase que obrigatório. Dos três, Apê, é o que mais me provocou a refletir. Não porque me identifiquei com sua personalidade ou então sua história de vida, mas porque é um retrato que o livro faz de uma pessoa que tinha tudo pra continuar em seu mundo, do lado certo do túnel e nunca se importar com o lado errado, mas que em um momento de ebulição, foi empurrado para ver o mundo real e não virou as costas. Mesmo com suas contradições, foi-se modificando e percebendo que precisava mudar, se movimentar, se organizar. As leis das quais era tão crente, o tal Estado democrático de direito, não era mais do que um conto de fadas contado pelos engomados da "nacional de direito". Apê só consegue de fato perceber tudo isso, no momento em que o caveirão se pôs na Pres. Vargas. Aquele fato, é o que precisava para sua ficha cair e acredito que para muitos naqueles ido de junho também. Sua jornada é algo irritante, angustiante e fantástico de se acompanhar. 

Já Ventania, bom, ela é da América do Sul. Cowboy, do ouro, do mundo, de Vassouras. Flávia é uma jovem que não se rende, que mesmo passando por diversas dificuldades e até mesmo com a maternidade prematura, nunca virou as costas para seus sonhos, sua arte. Ela expressa uma juventude que se recusa a ser sepultada em sua essência, que não aceita de modo algum ser podada. Não importam as consequências, não será o redemoinho que se curvará às árvores, mas o contrário. A cena em que ela encara os PMs sozinha dotada apenas de um violão é empolgante, assim como toda sua luta por ser respeitada como artista e também para sobreviver no Rio de Janeiro. Foi incrível perceber como os protestos mostraram a ela que ela não precisava lutar sozinha, pois não estava, que existia todo um povo junto a ela nessa mesma batalha diária, que não era uma imprestável por ter 24 anos, não possuir um emprego e um filho para criar solteira. Magnífico!

Navalha é de fato o grande protagonista de Junho Febril. É difícil não colocar dessa forma logo na primeira linha do parágrafo, pois o ódio de Roberto Carlos é um ódio genuíno, um ódio profundo, um ódio que não é só dele, mas sim, um ódio profundo e secular, um ódio indescritivelmente justo. É impossível para qualquer pessoa que tenha crescido nas esquinas do subúrbio carioca, da baixada, da velha São Gonçalo, de toda periferia do Brasil, não se identificar com esse personagem. Todo seu desenvolvimento mostra o que de fato foram os protestos de 2013, um grande mar de pessoas com ódio a um sistema, aos porcos fascistas fardados, de togas e gravatas, que em algum momento perceberam que podiam rebelar-se, que rebelar-se é justo. Nesse contexto, as jornadas de Junho de 2013 foram o estopim para Navalha descobrir que é possível revidar, que há um caminho, que a "firma" não é o único jeito de marchar contra os porcos e tampouco que são eles os únicos alvos.

 A história de Navalha não é a história só dele, é a história de sua mãe, do seu irmão, do seu amigo Golpe. Essa história se confunde com a história do meu vizinho, de João Pedro, de Ágata, de Amarildo, de Flávia. Pessoas, com nomes e histórias, que desde o seu primeiro minuto de vida nasceram com um grande X vermelho em suas costas, por serem pobres, pretos, favelados. Pessoas que lutam, lutaram e vão lutar toda a vida contra todo um sistema que tenta de todas as formas amansá-las, matá-las. 

E é esse o grande acerto de Junho Febril, é um livro de muitas histórias que nos levam a tantas outras histórias e no final, a trama principal nem é o mais importante. É fantástico um evento tão importante para o país, como foram as jornadas de Junho de 2013, poder ser trazido para literatura através de uma obra tão fantástica e que consegue tocar em tantos aspectos do que representou aqueles protestos para a sociedade brasileira e principalmente para a juventude, das mais variadas origens. Uma grande obra. 


sexta-feira, 23 de junho de 2023

As Balas Salgadas

A primeira reação foi olhar para trás, mas não deveria tê-lo feito. O barulho do caveirão passando a segunda marcha só não foi maior do que o som dos tiros que me chamaram atenção no princípio. O desespero não tomou conta por completo, pois naqueles meus 10 anos de vida, situações não faltaram pra me preparar para aquele tipo de momento. 

Viver em São Gonçalo tem dessas coisas, cada estouro pode sim ser o fim da linha, o achar das balas salgadas.

No meio, entre homens de pés descalços e carros blindados com canos de 762 expostos, entrei debaixo do carro mais próximo, foi o que deu pra fazer. As balas voaram perto naquele dia, posso me lembrar das frases em que pronunciei em meio ao desespero, rezei pra deus: 

- Pai nosso que está no céu, santificado seja vosso nome, vem a nós em vosso reino, seja feita a sua vontade, aqui na terra quanto no céu

Podemos dizer que naquela tarde quis muito acreditar em Deus, qualquer um, naquele momento em que fechei os olhos e só o cheiro da gasolina estava dentro de meu cérebro, quis muito mesmo conseguir ter algum tipo de fé em algo onisciente, onipotente, para acabar com todo o mal. Se bem que ali, naquele momento, para quem mesmo eu estava torcendo contra? não lembro. 

Foram alguns minutos debaixo daquele carro, o sentimento de terror completo, não era maior que a raiva, que o nojo daquela situação. 

Quando levantei, fui correndo para casa, senti ainda um medo profundo de menino, só queria ter certeza que a minha avó estava bem. Abri o portão, abracei-a firme, as lágrimas foram inevitáveis: aquele não foi o dia das balas salgadas me alcançarem. 


São Gonçalo, 2023


sábado, 17 de junho de 2023

Morte!

 A dor contida em meu peito, é uma dor duradoura, é uma dor que tem história, origem e tradição. A dor contida em meu âmago já foi um grito de socorro, já foi um arrependimento profundo, já foi um mar de desilusões. A dor contida em meu coração, é uma dor reprimida, é uma dor raivosa, uma dor que queima e arde até ser liberada. A dor contida em meu estômago, é uma dor que exige vingança, uma dor que não aguenta mais, não aguenta mais ver os mesmos atores massacrarem e usurparem. A dor contida em meus punhos é uma dor difícil de ser contida, uma dor que estala, uma dor que instiga, uma dor que quer sair. 

Por isso estou declarando, do fundo da minha alma: Morte! Morte à dor! Morte à velha São Gonçalo, morte aos espoliadores, morte aos assassinos e seus lacaios, morte ao velho Estado! 


São Gonçalo, 2021


sexta-feira, 26 de maio de 2023

Confissões ao Sandman

 Estava aqui matando tempo, olhando para a Guanabara em uma manhã cinza, sentindo o cheiro fétido da porca cidade sorriso. Ocorreu-me que já fazem semanas que tento, mas não consigo escrever sobre o atual momento, as palavras tem assustado. O drama é algo muito próprio dos escritores, felizmente não sou escritor.

A ansiedade feroz, aquela que consome tudo, essa quando tem seus motivos, se instala e não deixa mais nada prosperar. 

Sonhar não é de todo ruim. Ainda mais quando o sonho é justo, quando podemos especular com o irreal. Porém sonhar com o impossível tem seu preço e não sei se consigo pagar. 


Tenho um sonho. Um que morpheus esculpiu de suas areias com uma imponência e ferocidade que me encanta. Um sonho belo como o nascer do sol no verão, como a vista da lagoa de Itaipu. 


Já faz anos que essas areias presenciam um vai e vem, idas e vindas, brigas e decisões erradas. Causa-me tristeza profunda ter sentido tantas vezes que faltava pouco, causa-me tristeza perceber que talvez esse sonho só não seja pra mim. Queria ter esperança que as coisas  pudessem ser diferentes, mas não tenho.


Tem dias que é insuportável, dias em que a ansiedade toma conta. Tenho uma queda pelo impossível e ela é somente um sonho em minha vida, um daqueles que nos derrubam lágrimas pela manhã, que nunca irão se tornar reais 


São Gonçalo, 2023




segunda-feira, 22 de maio de 2023

É Necessário a Vida!

É necessário viver!

Por um mundo diferente, 

por um futuro que exista 


É necessário viver!

Aqui e agora,

não há outra vida,

nem outro mundo,

fugir da realidade é impossível 


É necessário viver!

Até mesmo as lágrimas,

as derrotas e frustrações

O nosso povo nunca abaixa a cabeça,

por que deveríamos?


É necessário viver!

Pois viver é lutar,

e a vida só tem sentido na luta

Podemos mover montanhas,

somente com nossos punhos 


É necessário viver!

Mesmo quando temos que dizer adeus

As partidas doem,

mas é necessário viver 

É assim que honramos a memória,

dos que agora só vivem em nossos corações


É necessário viver! 

Até quando precisamos encarar a morte,

sem ressentimentos ou remorso,

pois a morte também faz parte de viver


É necessário viver!

Por um mundo diferente,

por uma alvorada luminosa,

para que os próximos continuem vivendo


Niterói, 2023



domingo, 14 de maio de 2023

A Escuridão dos Bons Momentos

 A verdade é que tentei muitas vezes, mas não consegui escrever nem sequer um verso no dia de hoje. Estou naqueles dias que tenho tanto para dizer, porém poucas palavras conseguem escapar de meus dedos para exemplificar, para me explicar, para falar dessa ansiedade profunda que tanto tem me consumido. Esses são dias complicados pois é impossível ignorar.

Tenho tanto medo dos versos, principalmente aqueles que estão mais escondidos dentro de minha mente, os que tanto insistem em me maltratar. São tantas coisas para pensar, escrever: Para onde estou indo? Eu mereço estar passando por isso? O que será de mim na semana que vem? Alguém se importa comigo? 

É difícil querer ser feliz, é difícil não se desesperar frente aqueles momentos em que tudo parece estar onde deveria estar, pois normalmente o preço cobrado depois é demais para o estômago suportar. Os dias tem acontecido com tantos pontos altos, com vários momentos realmente notáveis. Tem gerado tantas dúvidas, tantas incertezas, que realmente não sei se quero desvendar.

Tenho medo da tempestade que se avizinha, dos trovões, dos raios e dos bichos papões que tanto insistem em me aterrorizar.

São Gonçalo, 2023


 

quinta-feira, 16 de março de 2023

Amar é Simples

 O tempo não se compra, nem mesmo pode ser ignorado, algumas coisas resistem mesmo a terremotos. A intimidade em alguns casos é tão natural. Tão natural quanto a química que emana sem método científico, sem planejamento.

Amar é tão simples. Você olha para alguém e ama, conversa e ama, convive e tem certeza. Os dias passam, meses, anos: você olha e ama, conversa e ama, convive e tem certeza.

A velha sociedade tem uma capacidade tão grande de destruição, que até o amor é destruído, pervertido, transformado em uma mera futilidade, uma boçalidade utilitarista. As pequenas grandes coisas nunca entram na equação, as relações são subvalorizadas, os padrões são os pavões e bichos papões. 

As lágrimas são inevitáveis e tenho medo do escuro, durmo sozinho todas as noites. Depois de uma caminhada tão longa até aqui, o que fazer? Acho que os bichos papões nunca serão superados, parece que nunca farei parte da equação. Mas o tempo não se compra, nem pode ser ignorado. A intimidade, a química: algo natural. 

O amor é simples. Você olha e ama, conversa e ama, convive e tem certeza. 

São Gonçalo, 2023


domingo, 5 de março de 2023

A Penetra


Hoje as lágrimas escaparam

Quando me dei conta,

meu rosto já estava todo molhado


A quietude ensurdecedora da solidão,

aquela que corrói,

que machuca

Tão silenciosa, 

chega mansa,

massacra de forma implacável

Insiste tanto em ficar,

me dilacera todos os dias


As Lágrimas nada mudam, 

amanhã preciso levantar 


A nostalgia altera tantas coisas

O ontem é confortável pois já passou,

ainda estamos vivos

Vivos!


Precisamos caminhar 


São Gonçalo, 2022

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

Aqueles Dias em que o Mundo Foi Nosso

Está ventando do outro lado da janela,

Não queremos ir embora

Porque aqui dentro tem um café,

e uma vista boa para a varanda

Subindo e descendo,

agora toca aquela musica

aquela das nossas madrugadas,

onde só a lua podia nos parar


Cruzando trilhos,

tínhamos mesmo só 15 anos

Sem hora para ir embora,

mesmo ventando do outro lado,

estávamos em nosso lar

Havia música e um pouco de amor

Perdidos e em sintonia:

Gritamos,

Festejamos,

e o mundo foi nosso


- São Gonçalo, 2019

terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Melancolia Marginal

 No primeiro momento é uma pontada forte, que vai se transformando em uma câimbra que repuxa, terminando num espasmo tão forte que paralisa completamente tudo. É uma dor tão forte, que às vezes não há o que fazer além de sentir, derrubando algumas lágrimas no processo. É algo inevitável, é o pedágio da idade. 

Esse mundo, esse velho mundo, esse velho Brasil, esse velho Rio de Janeiro, essa velha São Gonçalo, nos apunhala. Vivemos sob as ruínas de uma sociedade doente, sob a miséria de um Estado falido. 

A dor no peito, as lágrimas, o vazio sepulcral que tantas vezes se instala, a solidão inevitável de um marginal, são meras consequências. Amanhã tudo começa novamente, e é preciso estar de pé, pois os cupins comeram todos os pés da cama. 

São Gonçalo, 2023


segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

Domingo de Sol no Rio de Janeiro

 O caminho até a praia pode até ser tortuoso, mas nada impede o povo num domingo de sol no Rio de Janeiro. Nem mesmo um ônibus entupido de gente, ou a distância, pois tudo se resolve com um cooler cheio de gelo e um pagode na caixinha de som. Tanto faz o ônibus quebrar, uma hora vamos chegar, o céu azul é para todos. Cervejinha gelada, churrasco na grelha sob a areia e a água gelada do mar, esse é o espírito do Rio. 


Não sou tão chegado ao calor, mas nem preciso ser para sentir a felicidade que exala para todo lado quando o sol aparece num dia como esse, é só olhar em volta. Parece até, que pelo menos por um dia, não estamos mais em guerra, que por um dia, todo o conflito acabou. Pena que o domingo só tem 24h. 


Viver no Rio é viver em guerra. Contra a polícia assassina, contra o tráfico, contra todo o caos urbano. É uma guerra ininterrupta contra o velho Estado, que tanto mata e extorque o nosso povo, todos os dias. É preciso ter muita fibra pra não se deixar abater e o carioca não desiste, não deixa o sorriso do rosto sumir e mantém a esperança na luta. 


Entre as balas perdidas e achadas, entre todas as dificuldades que cada vez aumentam mais, o Rio de Janeiro é do povo que o constrói e resiste todos os dias e vai continuar sendo. 


Rio de Janeiro, 2023 



domingo, 8 de janeiro de 2023

Chuva de Janeiro

 Arriscar uma frase enfática apavora, mas não mais do que uma semana de chuva em janeiro. A eloquência de um início de ano pode nos levar a lugares nunca antes vistos, terrenos nunca antes explorados, até mesmo àqueles dias ensolarados. 


Mesmo o sol tendo nos abandonado, já é janeiro e o cheiro que vem desse recém chegado ano é de novidade, de grandes desafios, dos dias que vão entrar para a História. 


O cheiro de pólvora no ar não é por acaso, o Cruzeiro do Sul já está apontado para o Norte e o vento vem batendo forte nas palmeiras. Nada será como antes. 


  • São Gonçalo, 2023

sábado, 17 de dezembro de 2022

Uma Tarde de Verão

 O plano não era aquele, mas a Praia de Icaraí tem dias que chama. Estava quente, mas o vento forte acalmava. O céu estava tão azul, mas aquela sombra das árvores e as frestas de grama ajudaram contra o sol. Ela estava linda, com aquele jeitinho leve de lidar com qualquer tipo de assunto, qualquer conversa. 

Quando provei pela primeira vez daquele beijo, quando toquei pela primeira vez naqueles lábios tão gostosos, senti uma necessidade grande de aproveitar cada segundo daquela tarde. O nervosismo aumentava a cada segundo, não dava mais para disfarçar. Os medos, os traumas, até mesmo os pesadelos que assombram minha mente se multiplicaram. Mas nem precisava. Descobri rapidamente que tinha escolhido a melhor companhia para passar meu dia. 

Aquela moça, tão bonita, era tão charmosa, tão cheirosa. Seu corpo pulsava a cada toque, a cada mordida, a cada beijo. Sua liberdade me encantou, sua voracidade me arrebatou. 

A vida é curiosa. De repente um vento bate e a gente cai na Praia de Icaraí num dia quente, com vento forte, sombra, gramado e uma companhia ideal para uma boa tarde de verão. 

São Gonçalo, 2022


sábado, 15 de outubro de 2022

Uma Luta de Estudante

Para mim desde moleque a universidade pública sempre foi um sonho. Um sonho que em muitos momentos parecia simplesmente impossível de ser alcançado. Um sonho que quando de forma quase inacreditável aconteceu, não havia mais espaço em meu peito para tanta felicidade. No Brasil algumas coisas são tão inacessíveis, que para um pobre entrar em uma universidade pública muito suor, sangue e humilhações dos mais diversos tipos são necessários. Quando essas coisas passam e você consegue entrar, ai, ai é só felicidade. 

(Que claro, dura exatos dois dias).

Desde os primeiros dias percebi de forma bem rápida que se manter na universidade pública dói ainda mais que tentar entrar. Pois as humilhações aumentam, o esforço duplica-se e a chamada ‘’intelectualidade’’ é um punhado de pessoas mesquinhas e idealistas, que só conseguem mesmo é cheirar os próprios rabos e passarem o dia se drogando em suas ilusões pequenas e niilistas de mundo. A falta de apoio, das bolsas, de identificação estão ali para aumentar ainda mais o empurrão que nos dão em direção à porta dos fundos da universidade. 

E quando o momento chega, o momento de quase estar chutando o balde, precisamos lembrar que não estamos sozinhos. Tantos outros estudantes estão nesta mesma condição e precisamos estar juntos na luta por uma universidade pública que de fato tenha cara de povo e sirva ao mesmo. Só a luta muda tudo dentro dessa sociedade velha em que vivemos e não seria diferente na universidade também. Não adianta chorarmos sozinhos ou simplesmente abrirmos mão de algo que já tomou tanto de nós, é necessário a luta, é necessário nos apoiar em nossos iguais para vencermos mais essas batalhas que se impõem a nós. 

Nenhum passo atrás.

São Gonçalo, 2022 

domingo, 2 de outubro de 2022

A Luta é Necessária, o Voto, é Farsa!

 De A a Z, todos esses malditos já passaram por aquelas cadeiras de sangue. Mesmo os que individualmente não tenham passado, legitimaram e continuam legitimando esse velho Estado assassino, a opressão e pobreza do nosso povo. Agora eles vem mais uma vez, como vêm de dois em dois anos, posam de salvadores da pátria, como algo novo. 


Como ser novo querendo purpurinar o que há de mais velho em nosso país? O velho Estado que mata no campo e na cidade os filhos do povo, velho Estado que mantém um tribunal supremo com milhões e milhões de reais gastos por mês enquanto diz não ter dinheiro para pagar um salário digno aos professores, aos enfermeiros que tanto fizeram durante a pandemia. Dizem que não tem dinheiro para as pessoas que passam fome, que não tem dinheiro para dar moradia a quem não tem uma casa, mas vivem com seus esquemas e altos salários facínoras. 


Dizem que falta dinheiro depois da eleição, é claro, porque agora eles prometem mundos e fundos como estamos acostumados. 


É necessário dizer não! Não a esse falido sistema! É necessário não ter ilusão a respeito da farsa que são as eleições, esse jogo de cartas marcadas onde no fim quem sempre ganha é a classe dominante. Dos latifundiários e da faria lima. 


O que muda as coisas de fato e o que sempre conseguiu as coisas para o nosso povo é a luta, para a derrubada desse sistema e a criação de um novo. Afora o poder tudo é ilusão, está na hora de construir de fato um novo Brasil. Com toda a violência que será necessária para isso, não com flores e balinhas doces que esses mentirosos oferecem para ludibriar o povo.  


- São Gonçalo, 2022

quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Sobre Icaraí

Com certeza escrever uma crônica sobre Icaraí, estando em Icaraí, não é uma boa ideia. Porque estando aqui é difícil ignorar sua essência completamente nojenta e elitista, que transcende questões meramente econômicas. As pessoas daqui não são ricas, mas se acham como tal. O que em nosso país costumam confundir como se fossem a mesma coisa. Suas esquinas dão ânsia de vômito, são um mix revoltante de jóias de 20 mil reais e sem tetos nas calçadas, mas isso em si nem é uma novidade, é assim que as coisas são nesse velho país. 

A pergunta que fica é o porquê vir a Icaraí. Porque, bem, a praia é com certeza a mais bonita de todas. Acredito que não tenha comparação, não existe outra mais bonita. O Campo de São Bento é um lugar extremamente acolhedor e tem de tudo aqui, teatro, cinema e cafeterias. As ruas, construções, todo o modo como o bairro é organizado, parece até uma cidade de verdade. Isso é algo dúbio, porque me gera revolta, por que só aqui? É por que tão pouco? 

Ficamos brigando entre nós e não conseguimos ver que se essas pessoas são tão mesquinhas e que se são tantas, o problema não é individual, é social, é do sistema. Por muito tempo direcionei minha raiva aos indivíduos desse lugar e materializei isso ao bairro, que é somente uma convenção geográfica, nem existe no mundo real. Havia tanta raiva, tanta revolta e só agora compreendo para onde devo apontar. 

Ainda não gosto de vir a Icaraí, mas agora tudo é diferente. A verdade liberta de fato, de todas as ilusões e mesquinharias. 


Niterói, 2022


quinta-feira, 18 de agosto de 2022

As Tardes Vermelhas da Guanabara

Eu conheço todos os buracos entre São Gonçalo e Niterói, talvez conheça até mesmo todas as pedras do asfalto e mesmo assim não tem uma vez se quer que não fique impressionado com o fim de tarde da Baía de Guanabara. É como se eu me sentisse parte daquilo, como se de algum modo aquilo tudo também me pertencesse e na realidade, pertence, pertence a todos nós. 

Toda vez que subo na minha bicicleta em busca do meu futuro, em nome da luta por mundo diferente, é como se tudo aqui fosse cada vez mais parte de mim. A cada pequena vitória, a cada pequena luta, tudo avança e se transforma. Alguns porcos insistem em querer nos tirar tudo, até mesmo nossa cidade, nossa identidade, além da nossa dignidade. Temos visto tantas cenas lamentáveis, a Amaral Peixoto abrigando tantos apartamentos vazios e em baixo de suas pilastras milhares de famílias sem ter onde viver. Enquanto nas favelas o tiro come solto em cima das massas desarmadas, os malditos batem no peito para dizer que a cidade sorisso é exemplo para o Brasil. Exemplo de eugenismo, só pode. 

Para todo lado tudo que se vê por aqui é o povo que não aceita mais ser chicoteado, que cada vez mais levanta sua cabeça e luta. Os finais de tarde na Baía de Guanabara cada vez mais são vermelhos, e pertencem a todos nós. 


São Gonçalo, 2022


Aquele Dia em Jaconé

Passei algum tempo pensando dentro deste ônibus e realmente aquela rua de chão batido, no meio do mato, é assustadoramente empolgante de ser percorrida. Me lembra da última vez que vim a Jaconé. A primeira fulga ninguém mais lembra, mas eu lembro. Eu estava até com os pés no chão, pois os chinelos já haviam sido perdidos. Naquela época o vermelhinho seria muito útil, pois tive que pedir um favor que nunca vou poder retribuir àquele motorista do RJ 108.038

Pode parecer um pouco específico esse início, mas as coisas foram mudando tanto, se modificando tanto, que na maior parte do tempo dói muito refletir sobre. 

Dizem muitas coisas sobre família. Uma delas é que sempre parece que tudo vai acabar, mas não acaba. Porém entrei nesse ônibus sentido um gosto tão amargo na boca, acho que dessa vez acabou de fato. E começou a acabar naquele dia em Jaconé, naquela primeira fulga. 

O pior de tudo é que ninguém disse adeus, mas todos deveriam. 

A nostalgia é vadia, mas o amor filia ordinário, e é por isso que não abro mão de tentar, de subir no E14, de adentrar as escuras ruas de barros no meio do mato, assustadoramente incríveis. Porque sinto falta de me sentir protegido, abrigado, sinto falta de sentir que ainda há uma família de fato. 

Saquarema, 2022 


Simplicidade

 A simplicidade é tão valorosa, 

não há nada mais bonito


O nosso povo luta tanto, 

é tão massacrado, 

e mesmo assim é fiel,

não abre mão do trabalho duro e da cervejinha do domingo


Churrasco torrando,

Pagode tocando, 

Sorrisos esvoaçantes,

O Rio de Janeiro é mais do que aquela paródia de Miami


São Gonçalo e Nova Iguaçu, 

78km de distância,

mas o mesmo povo que faz qualquer lugar parecer com o nosso lar 


Nova Iguaçu, 2022


sexta-feira, 29 de julho de 2022

Puro Fascínio

 Tão doce é aquela moça,

tão inteligente é cada palavra que sai de sua boca


Seu sorriso é puro fascínio,

é o encanto daquela flor de outono


Nem muito, 

nem pouco

Aquele girassol só exala paz,

e leveza


Aquela boca, 

tão gostosa,

só me causa desamor quando vai embora

Pois quando está bem perto,

me vejo completamente aberto,

ao desejo

e ao seus beijos


- São Gonçalo, 2021


O Sorisso dos Pássaros

 É engraçado. Mas juro que olhei para o Pão de Açúcar hoje e o mesmo pareceu sorrir de volta para mim. Meus ossos tão doloridos até mesmo estalaram, todo cansaço foi embora e meus dentes rangeram, de pé novamente e em frente.

Os pássaros da Guanabara não parecem sentir dor, eles não se importam com quanto o vento está forte, eles só deslizam sobre ele e não se importam se está frio ou calor, chovendo ou um sol escaldante. Sem medos, sem amarras, sem desculpas, eles só seguem em frente. 

Hoje olhei para o Pão de Açúcar e juro que ele sorriu para mim. Me fez lembrar de pisar forte no chão, de não se importar com os medos, com as amarras, nem mesmo com o vento de sudoeste que tem soprado tão forte contra meu velho caíco. 

São Gonçalo, 2022


A Conquista do Atlântico

 Da minha janela dá pra ver a Baía e confesso que por muito tempo isso me bastou. Apenas assistir a maré subir e descer em todo crepúsculo e alvorada era o suficiente, mas conforme os anos foram passando, os poucos dias de passeio pelas praias do atlântico foram me instigando, me provocando. 


As 3 horas e meia dentro dos ônibus que subiam morros desnecessariamente íngremes, a volta toda coberta de sal por um longo caminho, o caos de ir em família com um complexo esquema de logística, desmotivava. Pouco tenho memórias concretas desses dias, pois eles foram muito poucos, momentos únicos durante a minha infância.

A verdade é que o Atlântico é negado para o povo de São Gonçalo, mas eu sempre me embasbaquei, sempre amei o oceano, sempre adorei olhar para o horizonte infinito e me sentir de alguma forma familiarizado com aquele vazio profundo e visceral. As ondas são sempre apenas um detalhe, que contrasta com a extrema paz que sempre sinto ao pisar naqueles grãos de areia tão finos que permeiam meu corpo mesmo após dias distante daquele lugar. 

São 24km que me separam do Atlântico, que me separam da praia, do sol, do horizonte e do azul do leste fluminense. Toda vez que o persigo, toda vez que pedalo pensando em debulhar-me naquele mar infinito sinto cada parte do meu corpo completamente viva, renovo-me para continuar lutando e mesmo os 24km da volta são uma inteira realização, uma felicidade e uma paz de estar transgredindo as diversas barreiras que a velha sociedade e o velho Estado colocam entre mim e o Atlântico. Pois se nos é negado as melhores coisas de nosso lugar, que tomemos-nos em nossas mãos! Que recuperemos um por um! 

São Gonçalo, 2022

domingo, 10 de julho de 2022

Momentos de Realização

 São incríveis aqueles momentos tão sucintos, tão repentinos, no qual podemos parar e olhar profundamente para algo ou alguém e sentir uma completa realização só por poder entender e ver a felicidade acontecendo. É como se, mesmo com a maré subindo, inundando, levando tudo para o além o mar, ainda desse para nadar, para segurar nas raízes das árvores submersas. 

Viver é lutar, viver na velha sociedade é se frustrar, se decepcionar, é sobreviver. Tais momentos sucintos, são tão únicos e sublimes que não podem ser explicados racionalmente, nem mesmo por palavras vazias. São aqueles breves momentos que só precisamos nos agarrar e gravar na memória. Pois quando a maré puxa forte, é nessas raízes que precisamos nos segurar, para não sufocar na água do mar.

São Gonçalo, 2021

segunda-feira, 25 de abril de 2022

Juventude do Povo

 É mentira, é mentira da burguesia

A juventude do povo não é feita de drogas,

de depressão, muito menos de inconsequência

A juventude é feita de uma força motriz, 

que move as correntes, 

que transforma qualquer coisa em eloquência,

que com as ideias corretas consegue realizar qualquer coisa


Com trabalho duro, tudo é possível, 

e a juventude do povo não se cansa, 

a juventude do povo é implacável

Acordando às 5, dormindo a meia-noite, 

Ajuda a carregar o Brasil nas costas


Na TV, nos malditos filmes ianques maldizem da juventude, 

a difamam

Chamam-na de vadia, de indolente, de drogada

Mas drogada é a velha sociedade, 

Doente é o velho Estado,

Que acha possível a juventude se sentir bem num mundo velho 


E quando a juventude do povo se põe na luta, 

não há caveirão que segure, 

não há fascista que lhe ponha medo,

tampouco tarefa que seja impossível

É disso que temem, e como temem!


A rebelião está na ordem do dia, 

e sua justeza está mais que clara, 

Tremam reacionários, 

a tropa de choque está cada vez maior 


São Gonçalo, 2022





As Pilastras de Xixi

Em outros tempos este desespero teria contaminado tanto que tudo viraria uma gritaria e tentativas de suicídio (e homicídio?). Mas agora esse tempo ruim só se transforma em uma dor profunda no peito e gases. É curioso pensar como em muitos momentos as coisas desmoronam de forma tão rápida, mesmo na maioria das vezes, os ventos nem sendo tão fortes assim.

Tento analisar e as conclusões que chego são tão feias: é muito difícil ver as nossas mesquinharias de forma mais íntima, só torna tudo pior. É como ir ao centro do Rio: provavelmente você não quer passar pela Central com seu cheiro característico de urina, carne podre e esgoto, mas você vai, porque é obrigado, porque é algo inerente a sua vontade, porque todo mundo que precisa ir de ônibus de São Gonçalo para quase todos os lugares do Rio, passa por ali. E é assim também com as nossas vidas, e eu não aguento mais as minhas pilastras sujas de xixi.

As frustrações, as decepções, as escolhas erradas, as erradas concepções que tanto se grudam e pesam em minha cabeça cheiram como o Rio Tietê, me causam náuseas. Parece que há uma banda de death metal em minha mente todo o dia e eu sei que é a velha sociedade quem é o vocalista. É ela que nos perverte, que nos faz sentir tão mal, que brinca com as nossas relações e acaba com tudo. É muito difícil nadar contra o ímpeto de não sair da cama, de não chorar todo o dia, de não se sentir sozinho ou um elemento esquisito, um elemento deslocado em meio até mesmo os meus iguais. 

É uma luta diária que é travada em nossas mentes para não sucumbir, para continuar lutando para destruir essa velha sociedade, para destruir todas as concepções erradas que tanto pesam sobre nossos ombros e mesmo que o desespero esteja batendo forte, não podemos ser idealistas. Não há caminho fácil, e as lágrimas derrubadas no caminho demonstram que há algo sendo destruído. Nenhuma criança veio ao mundo sem que sangue, gritos e lágrimas sejam derrubados, nenhuma revolução foi feita com pessoas vivendo no mundo do Oz. Se erramos hoje é porque ainda há trabalho para ser feito e não podemos esperar deitados em nossa cama. Precisamos lutar mesmo que capegando, mesmo que chorando e se sentindo um lixo. 

Para acabar com todos os monstros, todas as montanhas e seus pequenos morros. 

São Gonçalo, 2022

domingo, 6 de fevereiro de 2022

Patético

 Não escrevo pela literatura, ela nunca fez nada por mim. Já disse muitas vezes que para mim as frases são apenas um refúgio, são apenas a forma como consigo não explodir em meio às tantas coisas que se passam dentro da minha cabeça. Nunca prezei por poemas bonitos, nem crônicas bem escritas, nunca nem por um momento achei que qualquer um dos meus escritos não fossem absolutamente patéticos. Até porque, sempre que me olho no espelho é só isso que eu consigo sentir, por que eu olharia para minhas frases e enxergaria outra coisa? Não sou Fernando Pessoa, nunca nem quis ser, eu não consigo escrever mais do que meus olhos conseguem ver, não sou escritor, não sou artista. 

Eu não consigo nem sequer escrever inícios originais, são sempre os mesmos patéticos inícios e que sempre chegam nos mesmos patéticos finais, utilizando as mesmas patéticas palavras e eu nunca neguei, nunca neguei o quão patético são. Mas, aparentemente, ainda não ficou claro, ainda não ficou explícito o fato óbvio que não sou escritor, que não sou artista, que não escrevo minhas frases para agradar mas sim, para não surtar por ser uma pessoa patética


- São Gonçalo, 2022


terça-feira, 25 de janeiro de 2022

Em Memória de Brumadinho

 Um estalo e de repente, a onda veio

Uma onda espessa e marrom,

que levou vidas, 

que levou sonhos 


Os porcos não se importam

A ordem e progresso para eles,

pode ser soterrar pessoas vivas,

pode ser matar sem nem mesmo permitir gritos,

ou pedidos de socorro 


A Vale do Rio Doce,

a Vale da Morte,

dos assassinatos

Acha que tudo está acabado,

que o assunto está finalizado 

Mas a lama não evapora no vento,

ela depois de seca,

endurece como rocha


As massas se lembram de Brumadinho,

de Mariana 

Os mortos da Vale Assassina, 

Irão ser vingados 


  • São Gonçalo, 2022


segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

Dias de Atlas

 Tento levantar,

mas meus dedos não respondem,

Ainda não consigo superar que já amanheceu

o despertador já tocou,

o desespero já tomou conta,

Vai tudo começar mais uma vez,

e o matadouro está batendo a porta


Não descansei mais uma vez,

as lágrimas que secaram de ontem,

estão caindo novamente

Tento me conformar que vai começar de novo,

mas tudo que consigo é vomitar mais uma vez


Ainda não são 8 da manhã,

e o calor escaldante já começa a tortura,

berrar infelizmente não é uma opção 


De passo em passo, 

luto contra essa vontade enorme,

de me entregar ao fim 


Os minutos passam, 

mas a dor não

Não consigo parar de pensar, 

não consigo pensar, 

só quero não pensar

São tantas besteiras, 

é tanta raiva,

frustração 


As horas passam, como se fossem dias

Vivo no meio de surdos falantes,

e de falantes surdos 

A tristeza só aumenta conforme a meia-noite chega,

a solidão invade e da suas mãos com a ansiedade,

Tento desmaiar, mas tudo que consigo,

é me desesperar ao lembrar,

Que amanhã tudo se repetirá 


São Gonçalo, 2022


segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Um Poema Para Você

 Já faz anos que escrevo


Escrevi para tantas pessoas,

sobre tantas coisas,

com palavras bonitas e tristes,

mas até hoje não sei como iniciar um poema,

até hoje não sei escrever em versos 


Tento começar do começo, 

mas não consigo esquecer o fim,

não sei segurar essa vontade de dizer na primeira frase,

Que amo você 


Penso em tantas metáforas

Sobre flores,

estrelas,

até mesmo jardins e oceanos

Mas com você é diferente,

pois nunca sei por que escrevo,

e em alguns dias nem sei pra quem escrevo


Tem dias que você é a vilã, 

a que me despedaça,  

fria como o ártico

Em outros momentos é como se fosse meu porto seguro,

Com uma leveza e carinho que só você me dá


Eu não sei como começar poemas, 

mas sei como terminam 

Terminam naqueles dias,

que olho para você e fica evidente,

evidente que amo você 


Niterói, 2021

 


domingo, 28 de novembro de 2021

Zumbi, Chefe Revolucionário

Após sobreviver ao porão do navio da morte,

pisou em uma terra de sapê batido, 

já manchada de sangue nativo


Após as primeiras milhares de chibatadas,

se levantou junto aos seus camaradas,

vingou-se de seus senhores em busca de liberdade


Na mata, 

Palmares fez Zumbi

Chefe revolucionário que libertou seu povo,

que resistiu mais de um século 

Até hoje seu exemplo vive em todas as massas empobrecidas,

que se levantam diariamente contra o genocídio


Do Quilombo dos Palmares a Liga dos Camponeses Pobres, 

a luta pela terra no Brasil continua, 

a luta pelo parto da humanidade ainda perdura


Zumbi ainda hoje se perpetua, 

como um ícone da luta justa e crua do povo 


São Gonçalo, 2021 


sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Um Amor do Pandemônio

 É verdade, detesto muitas coisas. Entrei naquela sala, naquele dia, e tudo que senti foi um medo e ódio profundo. Medo de estar voando muito longe, onde meus pés não podem tocar, medo de estar sendo jogado aos lobos sozinhos e tudo que vi naquela tarde quente foram lobos. Dentre tantos rostos, tantas pessoas com suas histórias e construções sociais, a vi. No primeiro momento, pensei: ‘’se ela fosse do meu mundo, eu me apaixonaria’’. 

    Para ser sincero, não foi isso, mas gosto de pensar que foi. Porque não demorou muito pra esse sentimento tomar conta de mim durante semanas e só hoje consigo perceber que foi isso mesmo. E eu odiava, odiava o fato de não concordar em nada com ela, de tudo que saia de sua boca me impactar tanto sem ter sido a intenção. Bastou um mínimo aceno e lá estávamos, de repente, depois de meses entrando em colisão, conversando todos os dias. Ela era do meu mundo, afinal de contas, não era uma inimiga.

No meio do pandemônio, tudo floresceu. Enquanto tudo estava obscuro e terrivelmente triste, nossa relação era azul, amarelo e verde. Passamos juntos pela estação das brumas e tudo que eu senti foi uma vontade assustadora de guardá-la dentro de meu coração com todas as minhas forças e não deixá-la ir embora nunca de minha vida.

Nossas tardes foram tão fortes que sempre pareciam durar muito mais do que de fato duravam, só valiam os sorrisos, os olhares, a nossa química implacável e as nossas pequenas aventuras. Aquelas fugas em meio ao caos marcaram tanto, que até hoje sonho com elas, aquelas horas de paz com certeza ficaram marcadas na minha memória. Os olhos dela sempre tão profundos me atormentaram por tantas semanas, que até hoje me intimido com eles. Aquele rosto tão insuportavelmente bonito, o jeito de falar que sempre me transmitiam uma vontade desesperada de querer escutar mais, de querer chegar cada vez mais perto dela, me levaram a sentimentos tão fortes que não era possível ignorar. A fascinação por alguém é algo que não podemos escolher ou controlar no final de contas, se apaixonar é se desesperar e me desesperei. 

É difícil estar crescendo pois tudo sempre parece estar mudando, o tempo todo acontecem tantas reviravoltas e a maior parte delas simplesmente não levam a lugar algum, dói bastante não conseguir corresponder às mais torpes e pequenas expectativas que nos são imposta, pelos os outros e por nós mesmos. A magia que senti dentro do meu coração, todo aquele sentimento tão pulsante, no final de contas pareceu ser algo somente individual, metafísico, idealista. Sonhei em adentrar ao infinito, todavia esqueci que o trecho Niterói-Manilha da BR-101 Sul termina em Niterói, na saída 322. 

Me perdi em meus anseios, em meus próprios sentimentos e nessa crônica. Eu odeio, eu odeio escrever, porque por mais que eu queira, palavras não mudam nada e o vento as espalha tanto que por muitas vezes elas voltam e me despedaçam com ainda mais força.   


Niterói, 2021


A Velha São Gonçalo

 O que me vem à cabeça quando alguém fala de São Gonçalo? 


Casa, é o que vem à minha cabeça. A vista da Praia da Luz, a saída 316 da BR-101, a correria do Alcântara, o intenso laranja do fim de tarde da Guanabara. Lembro também de todo o sangue pobre derramado diariamente pelo velho Estado, lembro do lixo que é jogado aos montes, dos 70% de esgoto não tratado, da condição desumana que é a realidade de muitos neste lugar. 


Mesmo assim, o povo de São Gonçalo é como o pico do Morro do Castro, um lugar que mesmo tão largado, ignorado, apagado, violado, consegue se manter imponente. Entre as balas perdidas, as tempestades que tanto insistem em causar o caos, as pessoas que constroem esta cidade estão de pé todos os dias desafiando tudo que lhes é imposto. 


Para a juventude, a velha São Gonçalo é uma prisão invisível que os controla, fere, mata e oprime. Cresci aqui e vi com meus próprios olhos como ser jovem em uma cidade tão velha quanto esta é difícil, como é difícil não deixar o atrasado dominar por completo ou então não se dar por vencido. Tão bravos são os jovens da velha São Gonçalo, resistem a tantos ataques, lidam com seus dilemas da juventude em meio a um contexto de guerra diária, tanto contra a polícia, o tráfico, a milícia, quanto contra tudo que é mais atrasado nas massas profundas. Para ser jovem na velha São Gonçalo, é preciso deixar de lado as lágrimas durante o dia e lutar com a cabeça erguida para não sucumbir por completo.


Certa vez estive andando pela Estrada das Palmeiras, olhei para a serra do vulcão e me peguei embasbacado com sua beleza e imponência. Ao olhar para baixo, para frente, tive um choque ao observar que havia um mangue tomado não por animais, mas sim por pessoas que, no desespero, construíram suas casas em cima da lama espessa do manguezal. Eram pessoas tão miseráveis, que mesmo assim, não baixavam a cabeça, estavam dispostas a se ajudarem, com coragem e bravura, enfrentando literalmente e não literalmente jacarés e cobras para poderem viver. 


Quando alguém me pergunta: "o que você pensa quando alguém fala em São Gonçalo?" A resposta é óbvia: "O lugar de um povo com coragem". 


São Gonçalo, 2021



sábado, 30 de outubro de 2021

Versos Sobre o Tiago dos Santos

 Em meio às balas do velho mundo,

se levantaram os camponeses pobres do Tiago dos Santos

Com a ideologia em suas mentes,

e a memória dos companheiros assassinados em seus corações,

expulsaram os porcos e seus canhões

E mesmo os milhões gastos para massacrar,

não foram suficiente para neutralizar a justa rebelião do povo 


Corram seus ratos! 

Os camponeses pobres avançam,

do Norte ao Sul


Morte ao latifúndio e ao velho Estado!

bradam os verdadeiros democratas

A Revolução Agrária avança sob as bandeiras vermelhas,

e todo o sangue derramado irá germinar a luminosa alvorada


- São Gonçalo, 2021



domingo, 15 de agosto de 2021

Sobre o Nosso Amor

 Sempre estive errado, desde o primeiro dia. É difícil, mas a verdade é essa. Olhei para você certo dia, certa vez, e foi inevitável, foi imprudente. Entre diversos dias ensolarados, sorrisos, palavras doces e debates lacrimosos, as coisas foram ficando cada vez mais perigosas e cada vez maiores. O que é amar, se não se entregar? De certo modo, fui me entregando aos poucos sem nem perceber. Era só escutar sua voz falando sobre qualquer coisa, era só olhar seus imensos olhos, seu sorriso, não bastava muito para desvanecer cada vez mais em você. Era evidente que os nossos dias sempre eram os melhores dias, que não havia outro lugar melhor para estar e fui sentindo você cada vez mais perto.


Certo dia pelas baixadas litorâneas, estávamos admirando o pôr do sol e me senti tão feliz, era como se todos meus atrasos e pesos tivessem sumido por um instante. Quando olhei para você, que me olhava de forma tão profunda, parecia que finalmente alguém me amava também. Todas nossas histórias haviam de alguma forma, sido reais, vivas e do fundo do meu coração queria que aquele momento nunca acabasse, mas acabou. As coisas estavam muito explosivas e você optou por não se queimar. Quando escolheu seguir em frente, descendo o Eufrates, fugindo pelo Golfo Pérsico, foi como se alguém tivesse atirado tão forte em meu coração que eu não conseguia respirar. Passei tantas semanas com um gosto tão amargo na boca, chorando desesperado feito uma criança, resignificando em mente minha mente que o erro foi meu, desde o primeiro dia. E foi, de fato.


Mesmo desesperado, compreendi seus medos e sua fuga, não a contestei e até hoje não contesto. Nosso amor nunca foi comum, nunca foi convencional e seria impossível ser, pois não somos comuns, nem convencionais, vivemos nossas novas vidas buscando se livrar do velho em nossos corações, deixando para trás tudo que é ultrapassado. Sinto todos os dias sua falta, pois entre todas as coisas do mundo, a única que não posso ter é o nosso amor. Mesmo buscando-o entre o nosso céu azul do Leste Fluminense, ele sempre foge de mim e por muitas vezes parece que nunca vou conseguir alcançá-lo.


São Gonçalo, 2021 


sexta-feira, 6 de agosto de 2021

A Luta pela Vida

 Há quem queira pular carnaval em cima dos corpos vitimados, tem quem prefira micareta à luta contra o velho Estado. Não tem covid que amanse, a sede de sangue dos velhos vampiros das classes dominantes. Eles tem sugado tudo do povo ainda mais nesses tempos de pandemia, deixando só os ossos para os mais pobres. A rua tem começado a aparecer, a falar, em breve o fogo vai tomar conta e os blocos carnavalescos vão novamente se esconder como ratos covardes. Escoltados pela pelos assassinos fardados, irão voltar para suas campanhas eleitorais on-line eleger seus exploradores de estimação. Enquanto o povo continuará lutando por sua existência com unhas e dentes, independente da cor da prefeitura.  


São Gonçalo, 2021


Cravos Sangrentos de Primavera

 É difícil começar um poema

ainda mais quando se tem tanto para falar, 

quando a cabeça está pulsando tanto, que dói

A vontade que bate é de gritar,

tentar soltar tudo de uma vez

Mas o papel é sempre binário,

sempre preto no branco, nada mais,

e minha mente tem tantas cores


Tem sido um tempo de pensamentos dispersos,

de desejos distantes,

um tempo de flores de primavera,

e espinhos sangrentos. 


São Gonçalo, 2021







Entre o Tigre e o Eufrates

 "Mesopotâmia'' significa "entre rios", a histórica cidade tinha esse nome pois ficava entre o Rio Tigre e o Rio Eufrates. Entre dois rumos distintos prosperou. Mesmo em meio a uma encruzilhada, sempre souberam para onde apontar. 

Queria poder dizer o mesmo sobre meus sentimentos, pois muitas vezes parece que as encruzilhadas em que me coloco, cada vez mais se abrem em novas direções. 

Muitas vezes é difícil dizer o que se passa pela minha mente, o que sinto dentro dos meus pensamentos e vontades. É tanta informação, tanta dispersão, que no final das contas meu coração é somente um emaranhado de impulsos soltos e completamente desprovidos de qualquer direção. 

Eu não sei, não sei se todos eles convergem em uma direção única, ou se essa direção única em algum momento se divide em tantas outras direções. O que sei, de fato, é que eu não acredito que alguma dessas direções me leve ao pôr do sol, ao final feliz, mas todas elas poderiam. 

Sou apaixonado e é real, todas as direções são reais, eu não minto, só muitas vezes sinto demais. No fundo eu sei qual foi a primeira direção, entre todas as direções, caminhei por algum tempo e simplesmente não cheguei ao final. Tentei um novo caminho, novamente, não deu certo.

Tenho certeza que este relato literário está confuso, confuso como meu coração, que só sabe amar e sofrer em busca de alguma direção. 

- São Gonçalo, 2021

segunda-feira, 26 de julho de 2021

A Praça Tiradentes

Estar na Praça Tiradentes é como adentrar em um mar de nostalgia, lembranças de um tempo quando o centro do Rio de Janeiro aos meus olhos de criança era o lugar mais incrível do mundo. Os prédios tão altos me faziam sentir como se fosse uma formiguinha. Pareciam tão misteriosos, continham tantas histórias e desbravar essa imensidão de lugares fantásticos com meu herói de infância, tornava tudo ainda mais incrível. 

Houve um dia que choveu tanto, tivemos que nadar por uma uruguaiana completamente alagada e ao chegarmos no 545D, um sorriso tomou conta de meu rosto, pois no fundo eu sabia que aquela aventura nunca sairia da memória. 

Queria poder esquecer, queria poder ignorar, mas a nostalgia é sempre cruel, é sempre malvada. Estar na Praça Tiradentes é como adentrar num mar de nostalgia, é o lugar onde sempre vou lembrar que um dia já tive um herói, um exemplo a ser seguido, um amigo, um avô. 


Rio de Janeiro, 2020. 


terça-feira, 22 de junho de 2021

Lembraremos

 As jaulas para os mais pobres são muito duras

são invisíveis e resistentes,

em algum nível, até mesmo intransponíveis 


A maior parte do povo,

só consegue sair delas após a morte,

não conseguem ter acesso á vida de fato,

nem por um minuto


É tanta exploração,

tantas batalhas,

tanto trabalho,

tantas ilusões criadas pela velha sociedade

As massas mais profundas não conhecem a verdadeira liberdade,

a liberdade que só vem com a luta pelo fim do velho,

com a consciência política do caminho certo,

com a capacidade de ver suas próprias amarras


É triste perceber que a vida de pessoas tão honestas, tão virtuosas, 

vale tão pouco

Pessoas que lutam pelos motivos errados toda a vida,

que morrem sem ter sabido os motivos para tanta exploração, para tanta miséria

É necessário honrar a memória delas,

é necessário aceitar o que for preciso para que elas sejam vingadas


Adeus, mais uma vez preciso dizer

O povo sempre se lembra do povo no fim das contas,

pois nós só temos nós


A conta do genocídio será cobrada dos generais,

de Bolsonaro, dos oportunistas, dos latifundiários

A vitória tarda mas não falha,

iremos revidar


São Gonçalo, 2021

  


domingo, 6 de junho de 2021

A Praia das Pedrinhas

A Praia das Pedrinhas não possui pedrinhas,

isso me dá nos nervos 

Ela deveria se chamar Praia do Fim de Tarde,

pois o laranja que reflete da Guanabara,

a transforma em uma obra de arte   


A calmaria da maré baixa,

o ventinho fresco,

é a Praia da Calmaria,

da paz


A beira da BR,

o esconderijo perfeito,

o palco de tantas fugas e histórias,

é a minha praia,

Praia do João


A poluição é a nota triste,

assim como o apagamento,

o esquecimento

Mas nem tudo que é bom é lembrado,

ou apreciado da melhor forma


A Praia das Pedrinhas não possui pedrinhas,

mas possui beleza,

paz,

e histórias 


São Gonçalo, 2021


sexta-feira, 28 de maio de 2021

Povo pelo Povo

Apesar de algumas visões atrasadas,

de algumas frases infundadas,

abraçar o imobilismo é abraçar a morte do povo


‘’Fique em casa’’,

bradam os humanistas de ocasião

Não pensam nos que não tem casa,

nos que não tem luz,

nos que não tem pão,

nos que não tem chão

Eles ignoram que o trabalho pesado não parou,

o BRT entupido também não,

O preço da carne só aumentou,

as mortes na favela e no campo também


O golpe militar, está na esquina

Militares e o nefando estão disputando,

quem vai consumar

Os humanistas de ocasião não ligam:

‘’vamos esperar a CPI’’

CPI dos espoliadores do povo,

que promete punir outros espoliadores do povo,

A rua sabe que o caminho não é esse


Há quem queira pular carnaval em cima dos corpos vitimados,

tem quem prefira micareta à luta contra o velho Estado,

(ou então um twittaço radical)

Mas o povo é quem morre,

é o povo que se defende,

e é o povo que sairá vitorioso da luta


A rua está voltando a falar mais alto, 

em breve o fogo vai tomar conta,

e os ratos covardes irão se esconder

(ainda mais) 


São Gonçalo, 2021