domingo, 28 de novembro de 2021

Zumbi, Chefe Revolucionário

Após sobreviver ao porão do navio da morte,

pisou em uma terra de sapê batido, 

já manchada de sangue nativo


Após as primeiras milhares de chibatadas,

se levantou junto aos seus camaradas,

vingou-se de seus senhores em busca de liberdade


Na mata, 

Palmares fez Zumbi

Chefe revolucionário que libertou seu povo,

que resistiu mais de um século 

Até hoje seu exemplo vive em todas as massas empobrecidas,

que se levantam diariamente contra o genocídio


Do Quilombo dos Palmares a Liga dos Camponeses Pobres, 

a luta pela terra no Brasil continua, 

a luta pelo parto da humanidade ainda perdura


Zumbi ainda hoje se perpetua, 

como um ícone da luta justa e crua do povo 


São Gonçalo, 2021 


sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Um Amor do Pandemônio

 É verdade, detesto muitas coisas. Entrei naquela sala, naquele dia, e tudo que senti foi um medo e ódio profundo. Medo de estar voando muito longe, onde meus pés não podem tocar, medo de estar sendo jogado aos lobos sozinhos e tudo que vi naquela tarde quente foram lobos. Dentre tantos rostos, tantas pessoas com suas histórias e construções sociais, a vi. No primeiro momento, pensei: ‘’se ela fosse do meu mundo, eu me apaixonaria’’. 

    Para ser sincero, não foi isso, mas gosto de pensar que foi. Porque não demorou muito pra esse sentimento tomar conta de mim durante semanas e só hoje consigo perceber que foi isso mesmo. E eu odiava, odiava o fato de não concordar em nada com ela, de tudo que saia de sua boca me impactar tanto sem ter sido a intenção. Bastou um mínimo aceno e lá estávamos, de repente, depois de meses entrando em colisão, conversando todos os dias. Ela era do meu mundo, afinal de contas, não era uma inimiga.

No meio do pandemônio, tudo floresceu. Enquanto tudo estava obscuro e terrivelmente triste, nossa relação era azul, amarelo e verde. Passamos juntos pela estação das brumas e tudo que eu senti foi uma vontade assustadora de guardá-la dentro de meu coração com todas as minhas forças e não deixá-la ir embora nunca de minha vida.

Nossas tardes foram tão fortes que sempre pareciam durar muito mais do que de fato duravam, só valiam os sorrisos, os olhares, a nossa química implacável e as nossas pequenas aventuras. Aquelas fugas em meio ao caos marcaram tanto, que até hoje sonho com elas, aquelas horas de paz com certeza ficaram marcadas na minha memória. Os olhos dela sempre tão profundos me atormentaram por tantas semanas, que até hoje me intimido com eles. Aquele rosto tão insuportavelmente bonito, o jeito de falar que sempre me transmitiam uma vontade desesperada de querer escutar mais, de querer chegar cada vez mais perto dela, me levaram a sentimentos tão fortes que não era possível ignorar. A fascinação por alguém é algo que não podemos escolher ou controlar no final de contas, se apaixonar é se desesperar e me desesperei. 

É difícil estar crescendo pois tudo sempre parece estar mudando, o tempo todo acontecem tantas reviravoltas e a maior parte delas simplesmente não levam a lugar algum, dói bastante não conseguir corresponder às mais torpes e pequenas expectativas que nos são imposta, pelos os outros e por nós mesmos. A magia que senti dentro do meu coração, todo aquele sentimento tão pulsante, no final de contas pareceu ser algo somente individual, metafísico, idealista. Sonhei em adentrar ao infinito, todavia esqueci que o trecho Niterói-Manilha da BR-101 Sul termina em Niterói, na saída 322. 

Me perdi em meus anseios, em meus próprios sentimentos e nessa crônica. Eu odeio, eu odeio escrever, porque por mais que eu queira, palavras não mudam nada e o vento as espalha tanto que por muitas vezes elas voltam e me despedaçam com ainda mais força.   


Niterói, 2021


A Velha São Gonçalo

 O que me vem à cabeça quando alguém fala de São Gonçalo? 


Casa, é o que vem à minha cabeça. A vista da Praia da Luz, a saída 316 da BR-101, a correria do Alcântara, o intenso laranja do fim de tarde da Guanabara. Lembro também de todo o sangue pobre derramado diariamente pelo velho Estado, lembro do lixo que é jogado aos montes, dos 70% de esgoto não tratado, da condição desumana que é a realidade de muitos neste lugar. 


Mesmo assim, o povo de São Gonçalo é como o pico do Morro do Castro, um lugar que mesmo tão largado, ignorado, apagado, violado, consegue se manter imponente. Entre as balas perdidas, as tempestades que tanto insistem em causar o caos, as pessoas que constroem esta cidade estão de pé todos os dias desafiando tudo que lhes é imposto. 


Para a juventude, a velha São Gonçalo é uma prisão invisível que os controla, fere, mata e oprime. Cresci aqui e vi com meus próprios olhos como ser jovem em uma cidade tão velha quanto esta é difícil, como é difícil não deixar o atrasado dominar por completo ou então não se dar por vencido. Tão bravos são os jovens da velha São Gonçalo, resistem a tantos ataques, lidam com seus dilemas da juventude em meio a um contexto de guerra diária, tanto contra a polícia, o tráfico, a milícia, quanto contra tudo que é mais atrasado nas massas profundas. Para ser jovem na velha São Gonçalo, é preciso deixar de lado as lágrimas durante o dia e lutar com a cabeça erguida para não sucumbir por completo.


Certa vez estive andando pela Estrada das Palmeiras, olhei para a serra do vulcão e me peguei embasbacado com sua beleza e imponência. Ao olhar para baixo, para frente, tive um choque ao observar que havia um mangue tomado não por animais, mas sim por pessoas que, no desespero, construíram suas casas em cima da lama espessa do manguezal. Eram pessoas tão miseráveis, que mesmo assim, não baixavam a cabeça, estavam dispostas a se ajudarem, com coragem e bravura, enfrentando literalmente e não literalmente jacarés e cobras para poderem viver. 


Quando alguém me pergunta: "o que você pensa quando alguém fala em São Gonçalo?" A resposta é óbvia: "O lugar de um povo com coragem". 


São Gonçalo, 2021



sábado, 30 de outubro de 2021

Versos Sobre o Tiago dos Santos

 Em meio às balas do velho mundo,

se levantaram os camponeses pobres do Tiago dos Santos

Com a ideologia em suas mentes,

e a memória dos companheiros assassinados em seus corações,

expulsaram os porcos e seus canhões

E mesmo os milhões gastos para massacrar,

não foram suficiente para neutralizar a justa rebelião do povo 


Corram seus ratos! 

Os camponeses pobres avançam,

do Norte ao Sul


Morte ao latifúndio e ao velho Estado!

bradam os verdadeiros democratas

A Revolução Agrária avança sob as bandeiras vermelhas,

e todo o sangue derramado irá germinar a luminosa alvorada


- São Gonçalo, 2021



domingo, 15 de agosto de 2021

Sobre o Nosso Amor

 Sempre estive errado, desde o primeiro dia. É difícil, mas a verdade é essa. Olhei para você certo dia, certa vez, e foi inevitável, foi imprudente. Entre diversos dias ensolarados, sorrisos, palavras doces e debates lacrimosos, as coisas foram ficando cada vez mais perigosas e cada vez maiores. O que é amar, se não se entregar? De certo modo, fui me entregando aos poucos sem nem perceber. Era só escutar sua voz falando sobre qualquer coisa, era só olhar seus imensos olhos, seu sorriso, não bastava muito para desvanecer cada vez mais em você. Era evidente que os nossos dias sempre eram os melhores dias, que não havia outro lugar melhor para estar e fui sentindo você cada vez mais perto.


Certo dia pelas baixadas litorâneas, estávamos admirando o pôr do sol e me senti tão feliz, era como se todos meus atrasos e pesos tivessem sumido por um instante. Quando olhei para você, que me olhava de forma tão profunda, parecia que finalmente alguém me amava também. Todas nossas histórias haviam de alguma forma, sido reais, vivas e do fundo do meu coração queria que aquele momento nunca acabasse, mas acabou. As coisas estavam muito explosivas e você optou por não se queimar. Quando escolheu seguir em frente, descendo o Eufrates, fugindo pelo Golfo Pérsico, foi como se alguém tivesse atirado tão forte em meu coração que eu não conseguia respirar. Passei tantas semanas com um gosto tão amargo na boca, chorando desesperado feito uma criança, resignificando em mente minha mente que o erro foi meu, desde o primeiro dia. E foi, de fato.


Mesmo desesperado, compreendi seus medos e sua fuga, não a contestei e até hoje não contesto. Nosso amor nunca foi comum, nunca foi convencional e seria impossível ser, pois não somos comuns, nem convencionais, vivemos nossas novas vidas buscando se livrar do velho em nossos corações, deixando para trás tudo que é ultrapassado. Sinto todos os dias sua falta, pois entre todas as coisas do mundo, a única que não posso ter é o nosso amor. Mesmo buscando-o entre o nosso céu azul do Leste Fluminense, ele sempre foge de mim e por muitas vezes parece que nunca vou conseguir alcançá-lo.


São Gonçalo, 2021 


sexta-feira, 6 de agosto de 2021

A Luta pela Vida

 Há quem queira pular carnaval em cima dos corpos vitimados, tem quem prefira micareta à luta contra o velho Estado. Não tem covid que amanse, a sede de sangue dos velhos vampiros das classes dominantes. Eles tem sugado tudo do povo ainda mais nesses tempos de pandemia, deixando só os ossos para os mais pobres. A rua tem começado a aparecer, a falar, em breve o fogo vai tomar conta e os blocos carnavalescos vão novamente se esconder como ratos covardes. Escoltados pela pelos assassinos fardados, irão voltar para suas campanhas eleitorais on-line eleger seus exploradores de estimação. Enquanto o povo continuará lutando por sua existência com unhas e dentes, independente da cor da prefeitura.  


São Gonçalo, 2021


Cravos Sangrentos de Primavera

 É difícil começar um poema

ainda mais quando se tem tanto para falar, 

quando a cabeça está pulsando tanto, que dói

A vontade que bate é de gritar,

tentar soltar tudo de uma vez

Mas o papel é sempre binário,

sempre preto no branco, nada mais,

e minha mente tem tantas cores


Tem sido um tempo de pensamentos dispersos,

de desejos distantes,

um tempo de flores de primavera,

e espinhos sangrentos. 


São Gonçalo, 2021







Entre o Tigre e o Eufrates

 "Mesopotâmia'' significa "entre rios", a histórica cidade tinha esse nome pois ficava entre o Rio Tigre e o Rio Eufrates. Entre dois rumos distintos prosperou. Mesmo em meio a uma encruzilhada, sempre souberam para onde apontar. 

Queria poder dizer o mesmo sobre meus sentimentos, pois muitas vezes parece que as encruzilhadas em que me coloco, cada vez mais se abrem em novas direções. 

Muitas vezes é difícil dizer o que se passa pela minha mente, o que sinto dentro dos meus pensamentos e vontades. É tanta informação, tanta dispersão, que no final das contas meu coração é somente um emaranhado de impulsos soltos e completamente desprovidos de qualquer direção. 

Eu não sei, não sei se todos eles convergem em uma direção única, ou se essa direção única em algum momento se divide em tantas outras direções. O que sei, de fato, é que eu não acredito que alguma dessas direções me leve ao pôr do sol, ao final feliz, mas todas elas poderiam. 

Sou apaixonado e é real, todas as direções são reais, eu não minto, só muitas vezes sinto demais. No fundo eu sei qual foi a primeira direção, entre todas as direções, caminhei por algum tempo e simplesmente não cheguei ao final. Tentei um novo caminho, novamente, não deu certo.

Tenho certeza que este relato literário está confuso, confuso como meu coração, que só sabe amar e sofrer em busca de alguma direção. 

- São Gonçalo, 2021

segunda-feira, 26 de julho de 2021

A Praça Tiradentes

Estar na Praça Tiradentes é como adentrar em um mar de nostalgia, lembranças de um tempo quando o centro do Rio de Janeiro aos meus olhos de criança era o lugar mais incrível do mundo. Os prédios tão altos me faziam sentir como se fosse uma formiguinha. Pareciam tão misteriosos, continham tantas histórias e desbravar essa imensidão de lugares fantásticos com meu herói de infância, tornava tudo ainda mais incrível. 

Houve um dia que choveu tanto, tivemos que nadar por uma uruguaiana completamente alagada e ao chegarmos no 545D, um sorriso tomou conta de meu rosto, pois no fundo eu sabia que aquela aventura nunca sairia da memória. 

Queria poder esquecer, queria poder ignorar, mas a nostalgia é sempre cruel, é sempre malvada. Estar na Praça Tiradentes é como adentrar num mar de nostalgia, é o lugar onde sempre vou lembrar que um dia já tive um herói, um exemplo a ser seguido, um amigo, um avô. 


Rio de Janeiro, 2020. 


terça-feira, 22 de junho de 2021

Lembraremos

 As jaulas para os mais pobres são muito duras

são invisíveis e resistentes,

em algum nível, até mesmo intransponíveis 


A maior parte do povo,

só consegue sair delas após a morte,

não conseguem ter acesso á vida de fato,

nem por um minuto


É tanta exploração,

tantas batalhas,

tanto trabalho,

tantas ilusões criadas pela velha sociedade

As massas mais profundas não conhecem a verdadeira liberdade,

a liberdade que só vem com a luta pelo fim do velho,

com a consciência política do caminho certo,

com a capacidade de ver suas próprias amarras


É triste perceber que a vida de pessoas tão honestas, tão virtuosas, 

vale tão pouco

Pessoas que lutam pelos motivos errados toda a vida,

que morrem sem ter sabido os motivos para tanta exploração, para tanta miséria

É necessário honrar a memória delas,

é necessário aceitar o que for preciso para que elas sejam vingadas


Adeus, mais uma vez preciso dizer

O povo sempre se lembra do povo no fim das contas,

pois nós só temos nós


A conta do genocídio será cobrada dos generais,

de Bolsonaro, dos oportunistas, dos latifundiários

A vitória tarda mas não falha,

iremos revidar


São Gonçalo, 2021

  


domingo, 6 de junho de 2021

A Praia das Pedrinhas

A Praia das Pedrinhas não possui pedrinhas,

isso me dá nos nervos 

Ela deveria se chamar Praia do Fim de Tarde,

pois o laranja que reflete da Guanabara,

a transforma em uma obra de arte   


A calmaria da maré baixa,

o ventinho fresco,

é a Praia da Calmaria,

da paz


A beira da BR,

o esconderijo perfeito,

o palco de tantas fugas e histórias,

é a minha praia,

Praia do João


A poluição é a nota triste,

assim como o apagamento,

o esquecimento

Mas nem tudo que é bom é lembrado,

ou apreciado da melhor forma


A Praia das Pedrinhas não possui pedrinhas,

mas possui beleza,

paz,

e histórias 


São Gonçalo, 2021


sexta-feira, 28 de maio de 2021

Povo pelo Povo

Apesar de algumas visões atrasadas,

de algumas frases infundadas,

abraçar o imobilismo é abraçar a morte do povo


‘’Fique em casa’’,

bradam os humanistas de ocasião

Não pensam nos que não tem casa,

nos que não tem luz,

nos que não tem pão,

nos que não tem chão

Eles ignoram que o trabalho pesado não parou,

o BRT entupido também não,

O preço da carne só aumentou,

as mortes na favela e no campo também


O golpe militar, está na esquina

Militares e o nefando estão disputando,

quem vai consumar

Os humanistas de ocasião não ligam:

‘’vamos esperar a CPI’’

CPI dos espoliadores do povo,

que promete punir outros espoliadores do povo,

A rua sabe que o caminho não é esse


Há quem queira pular carnaval em cima dos corpos vitimados,

tem quem prefira micareta à luta contra o velho Estado,

(ou então um twittaço radical)

Mas o povo é quem morre,

é o povo que se defende,

e é o povo que sairá vitorioso da luta


A rua está voltando a falar mais alto, 

em breve o fogo vai tomar conta,

e os ratos covardes irão se esconder

(ainda mais) 


São Gonçalo, 2021


sábado, 8 de maio de 2021

Como esquecer?

Como esquecer? 

Se tudo está tão recente,

se quando fecho os olhos ainda lembro do último dia

lembro de você olhando no fundo dos meus olhos,

do único momento da minha vida que tive a certeza que alguém gostava de mim


Como esquecer?

Se ainda me pego querendo você,

se ainda sinto o desejo de amar você,

de beijar você,

de estar com você


Como esquecer?

Se ainda nos damos tão bem,

se ainda em alguns momento sinto que existe,

que existe algo dentro de ti


Como esquecer?

Se ainda não parece que acabou,

se ainda sinto essa dor,

essa dor que insiste em não passar


Como esquecer?

Como esquecer os olhares, os sorrisos?

Como esquecer as conversas, as brincadeiras?

Como esquecer nossa ligação, nossa intimidade?

Como esquecer o azul?

Como esquecer aqueles dias?

Como esquecer você? 


São Gonçalo, 2021


sábado, 3 de abril de 2021

A Ex-Adolescência

 É difícil dizer o que é depressão quando se é pobre, pois quando se é pobre quase tudo se trata de apanhar e absorver, levantar e continuar. Sendo que a depressão é sobre apanhar, cair e continuar caído. Ninguém fica caído em São Gonçalo, os que caem aqui, caem sem respirar. É difícil dizer o que é depressão quando se é pobre, pois não nos é permitido ser deprimido de forma autêntica, não podemos simplesmente desvanecer em nossas camas, não podemos ter ataques de pânico no meio da rua, não podemos chorar frente ao perigo do inimigo. Quem é o inimigo? O inimigo é o velho Estado, a velha sociedade, a dor, o desemprego, as balas perdidas, as chuvas de verão, as ruas sem asfalto e agora até mesmo esse vírus maldito. 

Ser um (como é que chamam lá na Lopes Trovão? jovem adulto?) ex adolescente pobre é um saco de fato: não ter emprego, não ter dinheiro, não ter nome, não ter casa, ter somente pelo na cara e uma pressão completamente exagerada. O pior de ser um ex adolescente pobre, é ter sido uma criança pobre, um pré adolescente pobre e um adolescente pobre, acabamos normalizando tanta coisa, que é mesmo difícil saber o que é real de fato. A velha sociedade quer que acreditemos em todo esse lixo, quer que acreditemos nessa merda toda como algo que irá perdurar por toda nossas vidas, e quando eu olho para os meus companheiros de faixa etária, são tantos que acreditam, tantos que vivem em um mundo que julgam novo, mas é tão velho quanto o mundo de nossos pais. A juventude tem tanto medo de encarar a realidade, que prefere viver alucinada em um mundo de estruturas gasosas, de pilares compostos por fumaça, que a qualquer momento irá se dissipar. E por que? 

Boa parte deles sempre gostam de perguntar ‘’por que tanta tristeza?’’ a resposta honesta seria: ‘’Pois não há motivos lógicos para ser feliz morando aqui’’, porém no fundo seria uma resposta frágil, uma resposta não condizente com a realidade. É possível não ser triste sendo pobre, pois o que importa são as pessoas, é o lugar onde pisamos forte no chão, o que importa é a nossa luta diária por uma realidade diferente. Então por que? Por que tanta tristeza? Pois a juventude é nova, e a sociedade velha, e essa é uma conta que nunca vai fechar. Não somos compatíveis, pois somos duplamente deslocados. O velho Estado está em guerra permanente contra o povo, e a velha sociedade em guerra permanente contra a juventude pobre. É um tiroteio constante, uma batalha que deixa rastros permanentes em todos os meus irmãos e irmãs de classe.

É difícil controlar a tristeza, a dor. A depressão bate à porta sempre com tantos motivos, com tantas explicações lógicas, com tanta força, que muitas vezes as lágrimas são derrubadas automaticamente por qualquer brecha pequenina que encontra. A verdade é que para a maior parte das pessoas, resistir é fingir que nada existe, resistir é ignorar e ir trabalhar, pois para o povo o psicólogo acaba sendo sempre o batente. E quando não há um emprego para se esconder atrás, quando se é um ex adolescente que vive de favor na casa dos pais, o desespero é tão maior que muitas pessoas nem mesmo acreditam na tristeza do mesmo. 

A velha sociedade adora torturar, a velha sociedade foi construída para massacrar o povo e o faz em todos os níveis possíveis. O psicológico é o primeiro a ser atingido. Como são terríveis as pessoas de nossas famílias, todos temos uma história triste com isso, todos temos parentes que parecem terem saído de um episódio dos Simpsons ou de um algum filme ruim de terror estadunidense. E por que? Porque a sociedade que vivemos é doente, porque a sociedade que vivemos tenta nos transformar em sua própria imagem putrefata desde nosso primeiro passo no chão. E dói demasiadamente quando percebemos que ninguém escapa, e que a todo momento podemos ser bombardeados por pessoas próximas que não conseguiram se libertar dessa putrefação.

Como julgar? Meus pais nunca tiveram nada, nem os próprios pais tiveram. Os seus pais também não, e os dele também. Crescer na velha sociedade é se decepcionar, é se deprimir ou se dopar, não dá para escapar dessas três opções ao mesmo tempo, dá é para seguir pelas três. 

Conforme a criança vira homem, mulher, a velha sociedade só aumenta sua investida contra suas mentes, só aumenta sua tentativa de nos fazer desistir de viver, de nos fazer largar mão da luta pelo nosso lugar. E como são fortes as propagandas, como é forte a cultura reacionária em nossa sociedade, como ainda está impregnado em nossos dias tudo de ruim que a humanidade criou até hoje. Esses elementos não permitem a muitos observar o horizonte por cima da cerca, não permitem a muitos pedalar em busca do que vale a pena. 

E o que vale a pena? Lutar pelos nossos é o que vale a pena, lutar por uma nova sociedade, por um Estado verdadeiramente democrático é o que vale a pena. Olhar para o fundo de nossos iguais e não desistir de ser minimamente feliz, não desistir de conhecer todos os lugares possíveis, não desistir de ser livre. Ser um ex adolescente pobre e ter depressão dói tanto, arde muito e faz nossa boca ter um gosto amargo que não passa de forma alguma, mas de alguma forma nos mostra que ainda somos humanos, pois surtar ante toda essa merda é um atestado de sanidade. Um dia o povo irá criar os furacões e os ventos vão varrer toda essa podridão, vão levar embora toda essa poluição da velha sociedade e até mesmo a Baía de Guanabara irá se renovar, as águas cristalinas vão permitir que alcancemos o fundo de nosso âmago de forma tão visceral, que todas as dores irão passar.

- São Gonçalo, 2021

sábado, 27 de março de 2021

Tempos de Enganação

Meu coração está machucado,

Não há outra forma de escrever 


A verdade é universal, 

e é verdade, estou despedaçado 


A inocência é uma doença,

e estive doente


Estou em apuros, 

fui assaltado,

levaram até minhas lágrimas


Me sinto desorientado

Você foi embora,

e me deixou ainda mais solitário


São Gonçalo, 2021


O Gragoatá

 O barulho das ondas de Gragoatá,

É o barulho dos meus pedidos de socorro,

em todos aqueles dias estranhos de infância 

Entre tantas fugas, 

Só perceberam uma 


O cheiro de Gragoatá,

é o cheiro das minhas lágrimas de adolescente,

o cheiro de todo pânico,

e desespero juvenil 

Fui despedaçado tantas vezes, 

que realmente não sei como passei dos dezoito 


A brisa do Gragoatá,

é a brisa da vida adulta,

a brisa da tristeza em não ser nada,

a brisa da pressão social

Me disseram que as coisas mudariam,

mas a dor não mudou,

e as mentiras tem doído ainda mais 


Quando eu era moleque e fugia para Gragoatá,

Não existia nada mais lindo,

Outro lugar para estar 

E ainda não existe,

Pois o calçadão de Gragoatá,

É o calçadão de todas as dores da minha vida 


Niterói, 2021

Medo do Oceano

 Ainda tenho medo da Ponte Rio-Niterói

O vão-central é tão alto,

os aviões sempre perto e a água,

parece fria todas as vezes

Fria como essas noites

Tenho pensando nas mentiras todas os dias,

Porque tem palavras que o vento não leva,

Palavras que rasgam,

que insistem em fazer eco


Também tenho medo do túnel, 

da Roberto Silveira,

da Francisco Nunes da Cruz 

Niterói depois da São Lourenço,

é só assombro, é só solidão, só opressão

Todas as vezes que fecho os olhos,

é a bicicleta que escuto implorando,

pedindo para que eu chegue logo,

Mas nunca chegarei a tempo


Pois ainda tenho medo de descer o Cantagalo,

tenho medo de me desorientar no Cafubá,

de encontrar o caminho do mar,

e nunca mais voltar 


São Gonçalo, 2021 


terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Um Dia Diferente

Sou antiquado,

peguei na sua mão e me senti completamente realizado

É tão bobo,

mas fiquei feliz de acordar ao seu lado

Senti meu coração forte quando você disse,

quando você disse que gostava de mim

E quando te beijei,

e nem foi um beijo de verdade,

senti cada parte do meu corpo viva


Entrei em um estado de transe,

e lembrei de Thomas Hobbes:

''o homem é o único animal que tem o poder de se privar da razão''

Me privei,

e quando acordei,

chorei,

ainda estou chorando 


Renato dizia que disciplina é liberdade,

e eu sou uma pessoa livre,

preciso continuar assim

Pois sonhos de primavera,

são só sonhos


O metafísico não existe,

E a vida é mais que os nossos idealismos 


- São Gonçalo, 2021

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

A Juventude

A juventude é uma vitória. Todos aqueles dias tão vorazes em que sentimos a pele queimar de dentro para fora, são o motivo de toda a constante luta para ficarmos de pé. 

A juventude é uma vitória, ela é tão bonita, é como o fim de tarde em um dia de verão bem quente, é como deitar na cama depois de um dia intenso de trabalho

A juventude é uma vitória. Aquelas nossas atitudes totalmente emotivas, totalmente descabidas de quaisquer sanidade, são efeitos colaterais. Devemos nos perdoar por elas, pois ser jovem é ser apaixonado. Apaixonado por viver, apaixonado por se apaixonar por tudo que é mais apaixonante

A juventude é uma vitória mesmo quando as lágrimas caem, mesmo quando tudo parece triste e melancólico. 

A juventude é uma vitória porque a diferença entre estar vivo e morto são os sentimentos que constituem nosso âmago, e a juventude é só sentimento. É luta, é amor, é tristeza, é felicidade, é loucura, é raiva, é tesão, é insanidade, é desespero, é a vida em seu estado mais sublime. 

- São Gonçalo, 2021

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

A Pedalada

De gota em gota de suor, sinto toda aflição sair de dentro de mim, sinto-me mais leve, e a cada pedalada é como se eu me aproximasse do lugar onde mais quero estar. Mesmo esse lugar sempre sendo o próximo metro a ser pedalado, o quilômetro adiante.
 
O sol não incomoda, pois o sol é para todos e não segrega ninguém. Já o vento é inimigo, sempre empurrando tudo para trás, mas também levando com ele todos os medos da estrada, toda vez que bate forte em meu corpo. 

Ao final da rota, o mar é o prêmio. O mar infinito que só de ser olhado transmite tudo que preciso para continuar vivo, transmite tudo que preciso para lembrar-me que sou alguém. 

De dentro das entranhas exauridas, surge a centelha: quero pedalar por cima de todas as cercas. 

São Gonçalo, 2021

Psicopatia de Estado

 Nos tem faltado até ar no capitalismo burocrático

Corpos tem sido empilhados,

e tanto faz para os porcos

O velho Estado é assassino de nascença,

é psicopata por consequência


Enquanto o povo do Amazonas morre,

o latifúndio vive

Enquanto o povo do Brasil sofre,

os políticos querem faturar em cima das doses

A corda esticada sobre o pescoço dos periféricos,

está apertando cada vez mais


É momento de acabar com a morte,

é momento de acabar com o velho Estado

Na pandemia, 

precisamos fazer tomar uma decisão: 

Morrer sem ar,

Ou lutar 


São Gonçalo, 2021



terça-feira, 19 de janeiro de 2021

O Azul de Niterói

O azul do Leste Fluminense é vivo, 

é vivo como o coração dos que lutam

Assim como o verde da Serra da Tiririca,

que é gracioso como as nuvens de julho


Apesar de tanta segregação,

a cidade sorriso é do povo que nela trabalha

O Sossego da praia,

O pico do Cantagalo,

Os peixes secos de piratininga,

A desconcertante vista da Praia de Icaraí

As belezas da natureza devem e precisam,

ser desbravadas pelo povo, precisam servir às pessoas reais


Pois o azul do Leste Fluminense é de todos,

Niterói é do povo


São Gonçalo, 2020


terça-feira, 5 de janeiro de 2021

A Nova Década

Os dias tem sido melancólicos, esses primeiros da nova década. A nuvem obscura ainda tem bloqueado o sol, e a covid insiste em assustar, mesmo agora que não há mais como isolar. 

O Rio de Janeiro continua sangrando, a PM já matou inocentes em 2021. As gotas de chuva que já caíram na nova década, alagaram as ruas do antigo século em São Gonçalo. Morros de barro desbarrancaram, houveram muitas lágrimas e revolta dos silenciados. A corda está prestes a se romper. 

O Brasil entra na nova década, como saiu da antiga, em ebulição. 

- São Gonçalo, 2021

Vermelho, como Brasa

O Brasil é vermelho,

vermelho como brasa segundo o tupi

Vermelho também é a cor da revolta,

do sangue periférico derramado todos os dias pelo velho estado brasileiro


Eu nasci no Rio de Janeiro e nunca fui ao "Cristo Redentor",

Nunca vi os lençóis maranhenses,

Nunca naveguei pelo Pantanal Matogrossense

A Amazônia é distante,

assim como os Pampas 

Eu não conheço meu país,

Assim como meu pai não conhece,

Como minha avó não conheceu


Porém nós conhecemos o Brasil,

Conhecemos o vermelho como brasa,

a revolta, a luta,

e também infelizmente o sangue periférico derramado 


- São Gonçalo, 2021